Monday, September 17, 2012

Os rostos da República: Manuel Cerejeira (04)


É Manuel Gonçalves Cerejeira quem pressiona António Oliveira Salazar a aceitar o cargo de ministro das Finanças em Abril de 1928.

A portaria dos sinos gera um conflito que leva à demissão do primeiro-ministro, antecedida da demissão de Salazar que não é aceite e acaba por reforçar a sua posição.

Em Novembro de 1929, Cerejeira era nomeado Patriarca de Lisboa e, automaticamente, cardeal, o mais jovem membro do Colégio dos Cardeais, sendo conhecido como “Cardeale bambino”.

Cerejeira beneficiava da conjura dos sinos, porque a primeira escolha foram os Arcebispos de Évora e de Braga (Manuel Vieira de Matos) e, entretanto, Salazar criava dois pilares do regime – Acto Colonial e a União Nacional, em 1930 - , enquanto Cerejeira enervava o ditador com pedido de amnistia para alguns opositores. Salazar vai apresentar cumprimentos a Cerejeira e separam-se as águas. Cerejeira e Salazar despediram-se com “um aperto de mão que não foi igual a nenhum dos anteriores. As relações colaborantes passaram a ser frias e graves” – descreve Franco Nogueira.

Ao reivindicar a Liberdade para a Igreja, na chegada ao poder de Salazar, em 1932, Manuel Cerejeira coloca-se contra o comunismo e o totalitarismo de Estado.
Nessa perspectiva, compreendemos melhor a crítica à participação de católicos nas listas da oposição e nim à criação do Partido da Unidade Nacional.

A política era um negócio para Salazar enquanto o de Cerejeira passava pela “defesa dos princípios do regime, independência da Igreja e das legítimas liberdades do ser humano”.

A longa vida de Manuel Gonçalves Cerejeira foi terreno de irónicas contradições e de inúmeros efeitos perversos.
Garantida a independência da Igreja, a JOC e a Juventude Universitária tornaram-se os primeiros sinais de independência da Igreja face ao Estado novo.

Emancipar a Igreja, numa linha de independência na respectiva esfera e cooperação no terreno comum em que os dois poderes se encontravam” era a linha de acção do Cardeale Bambino. Foi assim que bateu o pé ao ministro António Carneiro Pacheco, quando este lhe pediu que dissolvesse o Escutismo Católico (cf. José Geraldes Freire, in Resistência Católica ao Salazarismo-Marcelismo, Porto, Telos, 1976, pp. 206-208).

O presidente do Conselho nunca ouviu as súplicas e queixumes do Cardeal porque achava que “cada um estava no seu papel” e a verdade é que Cerejeira nunca fez “o jogo das oposições, levantando a voz a condenar o regime” - como reconheceu mais tarde Marcelo Caetano.

Salazar há-de negar qualquer relação entre os católicos e a sua ascensão ao poder como resposta ao apelo de Cerejeira para que os católicos não caiam na “tirania pagã de César ou na tirania bárbara de Lenine”, pelo que os padres se deviam limitar à política do “padre-nosso” para fazer “reinar a justiça e a caridade”.

Chegávamos a 1933 quando o regime criava os pilares da repressão (PVDE e depois PIDE e o Secretariado Nacional de Propaganda, com o plesbicito da Constituição. O Estado Novo afirmava-se com o fracasso da greve geral de 18 de Novembro de 1934 e a ilegalização do Movimento Sindicalista de Rolão Preto.

Cerejeira lutou pela representação da Igreja na Câmara Corporativa e pelo ensino oficial segundo os princípios da “doutrina e moral cristãs, tradicionais do país”, mas teve de aceitar a Legião Portuguesa, a Mocidade Portuguesa e a Obra das Mães, abrindo o Campo de concentração do Tarrafal e a organização militar para adultos. A Mocidade Portuguesa gerava desconfiança a Cerejeira que lançou a Acção Católica que em 1940 já tinha 41 mil associados.

O Cardeal Cerejeira aproveita a encíclica contra o comunismo, de 1931, para condenar a revolução totalitária que conduzia “à miserável igualdade na escravidão”e a bomba dos anarquistas, a 4 de Julho de 1937, é aproveitada para engrossar a “lenda do carácter providencial de Salazar em inúmeras manifestações de apoio e missas de agradecimento organizadas pelo regime e pela Igreja”.

Cerejeira aproximava-se de Salazar e não tardava a ouvir-se, em 1940, Cerejeira bradar por “honra e glória ao Estado Novo, que, no ano jubilar da Nação portuguesa, institui uma ordem nova na qual se afirma a paz a e harmonia da Igreja e do Estado, pelo reconhecimento dos direitos daquela e garantia dos legítimos interesses deste”.

Daí a afirmar que “cabe aos cristãos derrotar o comunismo” foi um pequenino passo gigantesco a que o Estado Novo deve responder com “reformas para assegurar à classe operária as condições para uma existência humana e cristã, com o necessário à sustentação da vida, da família, da habitação e da educação”.


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