A campanha eleitoral,
em 1945, com a participação de católicos no Movimento de Unidade Democrática
(MUD) marca o começo de mudança na imagem de Cerejeira que começa a ser acusado
de “amarrar a barca de Cristo à barca de César”.
Cerejeira sente-se
obrigado a vir dizer que a Igreja “estava acima e fora da política concreta de
regimes, sistemas, governos, partidos, programas, pessoas enquanto estes
respeitem a liberdade da Igreja e os princípios fundamentais da ordem moral,
social e política”.
O Estado Novo não
atentava contra o altar e esta atitude gerou críticas de ambos os lados,
especialmente o MUD porque ele não criticava o Governo e omitia a falta de
liberdades e a miséria em que viviam os trabalhadores.
Cerejeira há-de
recordar dez anos depois os desgostos dos anos quarenta. Um dos casos foi o
movimento pacifista Metanóia, no qual estiveram activos os irmãos Sá da Costa e
o padre Joaquim Alves Correia, autor de um artigo censurado e de um livro.
Cerejeira desautorizou o livro e calou-se quando o autor foi forçado ao exílio,
em 1946.
Também a atitude do
seu amigo Francisco Veloso e do padre Abel Varzim, assistente da LOC, não
deixaram de marcara o Cardeal. A intervenção de Cerejeira nas eleições de 1946
desagradou a Salazar que recusou ir a Fátima.
Também a reforma da
educação primária e secundária arrefeceu as amizades entre os dois num momento
em que aparece na cena política portuguesa o Partido Comunista Português. Em
1947, Álvaro Cunhal piscava o olho aos trabalhadores católicos mas condenava a
Hierarquia pelo apoio quedava ao regime e mandatar o clero a pregar “o ódio aos
comunistas” e se colocar ao lado do Estado Novo, “um cardeal milionário, com
acções na Mabor, sempre ao serviço dos ricos, querendo falsamente fazer-se
passar por pobre” (cf. Arquivo da PIDE/DGS.)
A Acção Católica
começava a distanciar-se do regime e a denunciar a precária situação dos
trabalhadores, com o Padre Abel Varzim a insurgir-se contra “o abandono por
parte do Estado dos operários à avidez de muitos miseráveis patrões”.
O seu jornal “O
Trabalhador” era extinto em 1948 e o padre Abel Varzim é afastado dos cargos
que ocupava. Cerejeira abandonava o padre crítico avisando os militantes da
Acção católica que não lhes cabia lutar pela emancipação total da classe
operária.
Começava aqui o
afastamento crescente entre a Igreja e os trabalhadores “tocados pelo fermento
revolucionário” e as acusações de comprometimento da Igreja com o Estado não
cessavam de crescer, mesmo no seio dos católicos, entre os quais se contavam
Orlando de Carvalho, do CADC de Coimbra.
Fazendo passar a
ideia de que Norton de Matos era anticlerical, o Estado Novo consegue novo
fôlego nas presidenciais de 1949. Calando a oposição através da Censura,
Cerejeira refugia-se dentro da Igreja e só voltou a falar da política na
ocupação indiana de Goa, Damão e Diu. Os problemas da Igreja nas Colónias ou
dos movimentos operários tiveram a indiferença como resposta do Cardeal... que
ia perdendo qualquer autoridade moral diante dos portugueses e dos católicos
insatisfeitos com o endurecimento do velho regime, durante a década de 50.
Impondo Fátima ao
país, cultivando a pompa e circunstância, satisfazendo o seu apetite por longas
viagens, aquele que tinha sido uma referência dos portugueses contra os
apetites vorazes do regime caíra em progressiva decadência...ostentada em
miríades de sessões solenes banais e encenadas para amortecer a queda do
regime.
Anunciava-se um ano
de 1958 de verdadeira crise para a Igreja portuguesa, com o abalo causado pela
campanha do general Humberto Delgado que aglutinou à sua volta muitos católicos
que se ergueram contra este Estado Novo.
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