Saturday, November 28, 2009

Cândido Pedrosa: BE ignora o elementar



Há pouco mais de um mês, faleceu com 64 anos de idade, o Pe. Cândido Pedrosa e o seu corpo repousa no cemitério da sua terra natal, em Vilar de Figos – Barcelos.

Depois da sua ordenação há 40 anos, é quase unânime afirmar que foi uma vida pontilhada pelo serviço e entrega aos outros, como professor, como pároco de Aguçadoura de 1973 a 1992 e de Santo Adrião, Braga, até ao fim da sua existência.

Nesta comunidade, ao longo de quase duas décadas, foi uma presença animadora dessa obra social maravilhosa para várias centenas de crianças, jovens e idosos que é o Centro Social e Cultural de S. Adrião, liderado pelo dr. João Sousa.
Foi incumbido, entre 1993 e 1998, do cargo de director interno do Lar da Oficina de S. José, ano em que foi nomeado Arcipreste de Braga.

O Pe. Cândido exerceu um trabalho notável enquanto Presidente da Comissão Administrativa da Confraria de Bom Jesus do Monte, desde 2002.

Em Outubro de 2008 foi nomeado cónego do Cabido da Sé de Braga. São apenas alguns elementos de um curriculum que levaram – com toda a justiça — o presidente da Junta de S. Lázaro a sugerir um voto de pesar pelo seu falecimento.

Antes da proposta de João Pires, o Bloco de Esquerda aprovara uma proposta idêntica sobre o falecimento do seu dirigente e militante da UDP. A Assembleia Municipal pronunciou-se por unanimidade (cf. Correio do Minho e Diário do Minho).

Não tenho legitimidade para discutir currícula (até porque fui aluno do padre Cândido Pedrosa). Os membros do Bloco de Esquerda abstiveram-se na votação do pesar proposto pelo presidente da Junta de S. Lázaro.

É caso para dizer que os membros do BE “se sujam por pouco”. O padre Cândido Pedrosa também “nunca se instalou em maiorias sólidas e remuneradas”.

Ele foi um homem de “causas e de lutas”, a maior delas contra a doença, nos últimos quatro anos, que levou mais cedo do meio de nós, sem abandonar as suas comunidades e tarefas.

Como neste caso, a ignorância não é desculpável, a mesquinhez do BE e visão redutora do mundo e dos outros que pensam e agem diferente levaram mais uma lição dos outros partidos na AM de Braga na votação sobre a morte de um dirigente do BE.

Que não tenha sido em vão, essa lição de superioridade democrática e de elegância cívica (que, ou se têm... ).

É elementar, meus caros.

Tuesday, November 24, 2009

Homem e Cávado: rota de Santiago



A qualificação dos trilhos identificados como “Caminho de Santiago”, para que captem utilizadores, são um motor do desenvolvimento económico e o interior do Minho possui um desses motores completamente ignorado.

Trata-se do caminho que sai de Braga e percorre todo o vale do Cávado e do Homem até à fronteira da Portela, seguindo depois para Santiago.

Este motor de desenvolvimento que tem do completamente desprezado bem podia ser posto em andamento, nesta altura em que o mundo ibérico se prepara para celebrar mais um ano jacobeu.

A simples sinalização dos itinerários já não se compadece com as apuradas exigências dos novos caminheiros. Daí que a sua qualificação é cada vez mais uma exigência dos tempos modernos e as autarquias têm aí um papel essencial.

Os ancestrais caminheiros, viajantes e romeiros, os almocreves, mercadores e feirantes que, ao longo dos séculos, trilharam estes vastos itinerários de fé, cultura e riqueza turística, dão lugar a novos utilizadores, com um perfil cultural e nível económico que importa explorar do ponto de vista turístico e, consequentemente, económico.

Os “Caminhos de Santiago” estão a ser encarados como catalizador de um público específico, com exigências claras e expectativas elevadas quanto à qualidade da oferta dos serviços que procuram e necessitam no percurso que estão a utilizar.

Há uma espécie de consciência colectiva em toda a Europa com estes itinerários identificados para a necessidade de apurar a qualidade da oferta cultural, turística, económica e, na sua essência, comercial que não pode ser desprezada numa região que necessita de diversificar a sua oferta turística.

As autarquias minhotas integradas no Eixo Atlântico podiam criar espaços de debate para gerar iniciativas de identificação, qualificação e promoção deste trilhos da região do Homem e Cávado, à semelhança do que se faz, há mais tempo e com mais intensidade, com outros caminhos.


A tradição peregrina teve início no século IX, quando o Rei Afonso II caminhou de Oviedo a Compostela, para prestar homenagem ao Apóstolo Santiago, fundando assim o Caminho Primitivo.

Mais tarde, já no século XI, arrancou o Caminho Francês, existindo actualmente várias rotas que atravessam diversos países europeus. Uma delas, completamente ignorada, é a que sai da Sé de Braga, desce a Amares, segue por Terras de Bouro e sai para Santiago de Compostela pela Fronteira do Homem. No meu humilde, entender, Braga devia assumir-se como cabeça deste projecto, com benefícios evidentes, agora que é sede do pólo religioso do Turismo Porto e Norte de Portugal.

O património construído, a riqueza rural de solares e culturas, a variedade de tradições, a gastronomia e hotelaria e surpreendente riqueza da paisagem são razões mais que suficientes para que os autarcas lancem mãos deste recurso que valoriza e enriquece as populações visitadas outrora pelos peregrinos de Santiago.

Franceses em Braga há 200 anos (24)


Quando procuramos marcas deixadas pelo rasto da presença francesa em terras minhotas, não faltam elementos que atestam a sua presença e malfeitorias.

Damos apenas alguns exemplos alusivos a estas invasões que trouxeram até Portugal os ideais da Revolução francesa, contrariados a ferro e fogo pela resistência rural. É o caso do escudo de vermelho do brasão de S. Pedro d’Este, uma freguesia de Braga, que simboliza o sangue derramado por 23 habitantes desta aldeia , que perderam a vida a 20 de Março de 1809, no episódio da Batalha do Carvalho d’ Este, aquando da segunda invasão francesa.

Pela negativa, os franceses também deixaram muitas marcas da sua presença, a começar pelo santuário de N.ª Sr.ª de Porto de Ave, em Taíde – Póvoa de Lanhoso.

Neste santuário, se é possível contemplar os belos azulejos que revestem a igreja também vemos os órgãos de tubos, danificados nas invasões francesas.

Mais acima, foi recuperada recentemente uma tradição na freguesia de São João da Cova, Vieira do Minho, renascia a capela do Bom Jesus da Paz, erguida para assinalar a assinatura do Tratado de Paz entre Portugal e Castela, em 1668. Também por esta altura foi erguida, junto à capela uma casa de arquitectura céltica, hoje casa-museu.

O passar do tempo, no entanto, foi tirando força à tradição e os monumentos ligados às festividades foram degradando-se. Há anos a população de São João da Cova encetou a recuperação da capela, bem como a casa céltica, transformada numa casa-museu onde se guarda o espólio que restou da altura da edificação e que se salvou das invasões francesas.

Caminhando para Trás-os-Montes, temos os vinhos dos mortos, a tradição data, efectivamente, do tempo das invasões francesas. Foi durante a 2.ª Invasão Francesa (1809) e em face do avanço das tropas comandadas pelo General Soult, que na sua passagem tudo saqueavam, pilhavam e destruíam, que a população de Boticas, decidiu esconder, enterrando, o que tinha de mais valioso. O vinho foi enterrado no chão das adegas, no saibro, debaixo das pipas e dos lagares.

Mais tarde, ao desenterrarem o vinho, julgaram-no estragado. Porém, descobriram com agrado que estava muito mais saboroso, pois tinha adquirido propriedades novas. Era um vinho com uma graduação de 10.º/11.º, palhete, apaladado, e com algum gás natural, que lhe adveio da circunstância de se ter produzido uma fermentação no escuro a temperatura constante.

O Vinho dos Mortos é, por isso, o símbolo de uma guerra de subsistência, não só material e económica, mas também e essencialmente moral. É o exemplo da resistência do Povo de Boticas, “obrigado” a usar das mais inimagináveis formas de preservar o seu património.Certificado o Vinho dos Mortos de Boticas.
O enterro das garrafas ocorre no mês de abril, e a venda inicia-se em junho, apenas em quatro locais de Boticas.

Na próxima crónica falaremos sobre as festas de S. Sebastião, santo a que os nortenhos dedicam particular devoção por causa... dos franceses.

Na gruvura, da CM de Boticas, o Repositório do Vinho dos mortos

Tuesday, November 17, 2009

Um dia sem vergonha... em Berlim


 O mundo europeu esteve em festa para assinalar o 20.º Aniversário da queda do Muro de Berlim, acontecimento que pôs fim à chamada Guerra Fria e alterou o xadrez político mundial.

Antes do acto simbólico, Ângela Merkel atravessou a pé, na companhia dos ex-presidentes da URSS, Mikhail Gorbatchov e da Polónia, Lech Walesa, a ponte no antigo posto fronteiriço da Bornholmer Strasse, que há 20 anos foi o primeiro “rasgão” a abrir-se no Muro.

O ponto alto das festividades é o derrube do “dominó” gigante com uma extensão de cerca de 1,5 quilómetros.

A primeira “pedra” foi derrubada por Lech Walesa, para lembrar que foi na Polónia que se começou a rasgar a chamada Cortina de ferro, após a formação do sindicato independente Solidariedade pelos operários dos estaleiros navais de Gdansk, liderados pelo então electricista Walesa.

O Muro de Berlim, também conhecido por Muro da Vergonha, começou a ser construído a 13 de Agosto de 1961 pelas autoridades comunistas da República Democrática Alemã, para travar o enorme fluxo migratório de leste-alemães para o ocidente, devido ao descontentamento da população pela falta de liberdades e penúria económica.

Desde o fim da II Guerra Mundial, em 1945, cerca de 3,5 milhões de alemães de leste rumaram a Ocidente, virando as costas às promessas igualitárias do partido comunista da RDA.

Mais de 140 pessoas tiveram um destino mais trágico e pagaram com a vida, sob as balas dos guardas da fronteira leste-alemã, as tentativas de fuga rumo ao ocidente.

Numerosos chefes de Estado e de governo dos países membros da União Europeia, nomeadamente do primeiro-ministro português, estão presentes para assinalar esta data num momento em que se erguem novos muros que dividem e escravizam as pessoas.

Os mesmos que hoje se reúnem nesta festa carregada de tanto simbolismo quanta hipocrisia seriam incapazes de se reunir na fronteira entre Israel e a Palestina.

Sim, para derrubarem o muro que os judeus estão a construir para evitar, em nome da defesa da sua integridade nacional, o direito a qualidade de vida e emprego para milhares e milhares de palestinianos que estão a ser sufocados pelos estado israelita.

Este é também um muro da vergonha que os dirigentes ocidentais não têm vergonha de silenciar.é uma “realidade trágica” que continua sem ser resolvida.

A Europa e os estados deve assumir esta vergonha como fundamental para pôr fim a muitas situações que provocam o caos na região do Médio Oriente e que têm sérias repercussões no âmbito mundial.

São numerosos episódios de violência e dos desafios da livre circulação, colocados pelo Muro de Segurança, já reprovado pelas Nações Unidas — como o foi o Muro de Berlim — que violam a liberdade de religião e de consciência aos habitantes e um acesso permanente, livre e sem obstáculos ao trabalho e aos Lugares Santos por parte dos fiéis de toda religião e nacionalidade .

Quando o fizer, forçando o estado de Israel a cumprir o Direito Internacional, podem todos derrubar o dominó gigante dos muros que ainda separam as pessoas dos seus direitos. O muro de Sharon é três vezes maior que o de Berlim e tem oito metros de altura.

Este muro (na foto) confisca parte das terras da Cisjordânia e deixa os palestinianos fechados e fragmentados em três cantões principais subdivididos em diferentes regiões incomunicáveis.

Israel já construiu 400 dos 710 quilómetros previstos da divisória, e já deixou 97 comunidades palestinianas completamente isoladas.

A barreira isola Jerusalém Oriental da Cisjordânia e deixa 360 mil palestinianos desligados de seu povo e rodeados por um muro de 181 quilómetros.

Este muro deixa a Cisjordânia sem recursos hídricos e sem as principais terras agrícolas, como o vale do Jordão, desliga as comunidades e, ainda, dificulta o acesso às escolas, universidades e inclusive aos hospitais.

Mais do que assinalar os vinte anos da queda do Muro de Berlim, em Berlim os dirigentes dos principais países do mundo vivem um dia sem vergonha. Mais um... sem falar do muro da Irlanda do Norte e do que divide Chipre (todos na Europa das liberdades e das democracias).

Saturday, November 7, 2009

Os novos assessores de Sócrates




Os assessores de José Sócrates já foram definidos várias vezes como uma poderosa e eficaz máquina de propaganda, ao ponto de alguns partidos dizerem que o PS não governa, faz publicidade.

Espantosamente, aqueles que mais criticaram o Primeiro ministro constituem agora uma nova parelha de assessores que quer pegar no pálio da propaganda, com um bispo incluído.

Há temas que vão e voltam à agenda política sem que se perceba muito bem ou justifique tamanha insistência que contrasta com a ausência de outros temas como a regionalização, o apoio à maternidade num país em perda de população ou estímulos contra a desertificação deste rectângulo.

Um desses temas é o do casamento dos homossexuais que apenas tem servido para distrair os portugueses dos seus mais aflitivos problemas. Sempre que aparece nos jornais e nas aberturas de telejornais, o nosso primeiro-ministro esfrega as mãos de contente.

Para desgraça nossa e contentamento de José Sócrates, veio agora um senhor deputado do CDS-PP pedir que haja um referendo sobre casamentos homossexuais.

Aquele senhor deputado devia perceber, para além do que antes se disse, que não faz qualquer sentido estar agora a promover um referendo e já se verificou que o referendo é um modelo de decisão política habitualmente pouco participado pelos portugueses.

Para além de não ser original, a proposta daquele deputado democrata cristão, pois vem a reboque do Bispo do Porto, o casamento dos homossexuais constou nos programas de diversos partidos na última campanha eleitoral.

Com o mesmo objectivo de distracção dos portugueses, o bispo do Porto já tinha defendido um referendo e um grande debate nacional, sem pressas.

Como se esta diversão ainda fosse pouca para distrair os portugueses, surge agora a Associação Ateísta Portuguesa a aplaudir a decisão europeia contra a exibição de crucifixos nas salas de aula porque esta viola a liberdade religiosa dos alunos.

São abusos que, para a Europa, restringem os direitos paternos de educarem os seus filhos "em conformidade com as suas convicções". Ora, aí está mais outra caldeirada de bispos e ateus, de democratas cristãos e republicanos laicos para distrair os portugueses.

Quanto ao Governo, podemos ter fé que deve estar a divertir-se. Estes novos assessores — da causa homossexual e da liberdade — estão a prestar-lhe excelentes serviços.

Só falta aparecer um grupelho a divertir-nos com o iberismo e temos a tríade do salazarismo — deus, pátria e família — virada do avesso.

Regionalização: está na hora!





Luís Filipe Menezes tem o mérito de ter agitado as águas mornas em que vive a política portuguesa ao exigir ontem um "avanço sério" na regionalização para que "acabe o centralismo que está a destruir o país e a economia".

O autarca, reeleito com maioria absoluta, reivindicou um "reforço da capacidade afirmativa política da área metropolitana do Porto", e justificou a "necessidade de novos investimentos a Norte" como o caso da "ida do TGV ao aeroporto e à Galiza", do "alargamento da rede do Metro do Porto" e da "construção imediata de novos atravessamentos" entre as duas cidades separadas pelo Rio Douro.

O autarca de Gaia promete tudo fazer para que esta legislatura seja aquela em que se fará um avanço sério da regionalização, alertando para a urgência de um trabalho em conjunto dos partidos políticos, dos autarcas, dos deputados e dos órgãos descentralizados da administração.

Luís Filipe Menezes merece ser felicitado por retomar um tema que andou arredio — por causa de temas menores como as escutas e os casamentos de homossexuais — da Campanha eleitoral das eleições legislativas e também não se ouviu nenhum autarca de topo pugnar pela descentralização administrativa do país.

O caminho da regionalização foi apontado por unanimidade pela Constituição da República portuguesa, à boleia da criação das Regiões Autónomas que tão boa conta de si têm dado. Esta reforma fundamental para o desenvolvimento equilibrado do Continente tem sido travada porque grande parte dos seus defensores não conseguem disfarçar os seus interesses pessoais ou corporativos.

Ora, é o erro que, mais uma vez, o autarca de Gaia volta a cometer. A reincidência no erro não nos faz vislumbrar um debate inteligente, racional e sério sobre a descentralização administrativa do país, para alé´m de constituir um argumento a favor dos amigos e cúmplices sentados à mesa do terreiro do Paço.

No discurso de Menezes, mais uma vez o Norte é reduzido a Gaia e Porto. O resto continua a ser paisagem. Esta postura destes senhores que só olham para o umbigo do rio Douro retira-lhes toda a legitimidade para falarem em nome do Norte do país. Este foi, aliás, um dos argumentos que fez fracassar a primeira tentativa de Regionalização feita pelo Governo de António Guterres.

Está demonstrado — por toda a Europa — que a descentralização administrativa resulta num imenso rol de benefícios para as futuras regiões, a começar pela diminuição das desigualdades num país que assiste anestesiado ao fecho das escolas, de serviços de saúde, de serviços postais e culturais.

Apesar de mal colocado o problema — cinturado apenas no Porto e Gaia —, espera-se que este alerta de Filipe Menezes tenha seguimento. José Sócrates deve cumprir o que prometeu no começo da anterior legislatura mas parece ter-se esquecido à medida que o tempo foi passando.

Nós não esquecemos e os socialistas não podem permitir a violação flagrante da Constituição por omissão. Haja coragem para tomar esta decisão fracturante... na óptica do Terreiro do Paço. Com esclarecimento total e sem demagogia sabotadora e umbilical.

Resta esperar que os nossos autarcas do Minho não continuem distraídos com os seus quintais.

Franceses em Braga há 200 anos (23)


Na passagem das tropas francesas pelo Minho há 200 anos, Portugal foi o primeiro território de afrontamento entre dois grandes líderes militares europeus, antes do encontro final de Waterloo. Todos esquecemos que o "peso da mochila do soldado é incomparavelmente mais leve que o peso das algemas do escravo".

Como foi possível isto ter acontecido? Como foi possível sabendo nós que os "soldados portugueses vão a toda a parte e combatem quem se quiser, marcham sujeitos às maiores fadigas, sem um murmúrio, e vivendo apenas de pão e água com um dente de alho de condimento"?

A desorganização do Estado era quase perfeita, derivada de posições contraditórias dos conselheiros do rei, D. Pedro, aconselhado a fugir com a família real para o Brasil. A preparação da fuga foi uma enorme trapalhada a tal ponto de Junot, desesperado, ainda poder avistar os barcos em fuga, quando chegou a Lisboa.

A 24 de Novembro de 1807, Junot já estava em Abrantes, quando os conselheiros reais ainda o julgavam em Salamanca, enquanto o general Tarranco ocupava o norte do país. os dias seguintes foram de completo desvairamento na Corte.

A fuga da família real resultou numa confusão indescritível, levando a que se perdessem muitos bens se preparassem mal os navios que sairam no dia 27 de Novembro, com cerca de 13 mil pessoas.

Uma delegação da maçonaria antecipava-se e ia abraçar Junot a Sacavém, acolhendo-o como libertador e foi o que se viu.
A resistência popular logo se começou a organizar perante a inoperância da Corte e dos que viviam à sua sombra, quando Junot enviava os melhores soldados para combater em França, e ganha novo impulso quando os franceses hasteiam a bandeira de FRança no castelo de S. Jorge e arreiam a Nacional.

De Madrid vinha uma preciosa ajuda no ano seguinte e em trás-os-Montes, o General Sepúlveda dava o primeiro grito pela independência de Portugal. que ecoa em todo o país e perguntava a todos os portugueses: porque não resistimos?

Hoje, podemos perguntar: porque nunca se encarou seiamente a hipótese de resistência e se optoupela fuga?

Basicamente, a resposta encontra-se na falta de liderança, na situação política, na confusão ideológica, na traição de muitos e no medo de alguns acomodados.

D. Pedro não tinha estatura moral, intelectual e psicológica para assumir qualquer liderança nacional: era um pau mandado numa altura em que se exigia decisão, audácia. exemplo, força de vontade. O futuro rei era tíbio, indeciso, sem astúcia, mal aconselhado e dominado pela mulher de quem se veio a afastar depois.

Daí resultou a ausência de uma linha de actuação política, com objectivos definidos e estratégias claras para os alcançar. A economia, a diplomacia, as forças armadas e as informações estavam desarticuladas por causas ideológicas enraizadas nas ideias da revolução francesa. A massa cinzenta dividiu-se entre os ideais franceses e os interesses da aliança inglesa: o 'partido' dos interesses portugueses baqueou, numa altura em que psicologicamente se pensava que as tropas de Napoleão eram invencíveis e o medo se apoderou de muitos.

Nesta confusão ideológica, alimentada pelo medo, todos esqueceram um direito e um dever de cidadania: resistir a quem nos assalta a casa (portuguesa) é uma questão de princípio e uma questão de honra.

A resistência reforça a coesão de uma nação e a alma de uma nação "tempera-se" nos actos praticados em comunidade em momentos difíceis. A resistência ao ladrão garante os nossos direitos e aumenta a autoridade noral.

Na história de Portugal há muitos momentos de resistência: quem consegue fazer as Linhas de Torres, em 1810, com 108 fortes, 151 redutos e baterias e guarnecê-las com 68 mil homens e mais de mil peças de artilharia também teria conseguido organizar a defesa de Portugal em 1808.

Quem possui um punhado de pescadores — como os de Olhão — que atravessa o oceano num pequeno barco de pesca para ir ao Brasil dar a notícia da expulsão dos franceses, não pode encolher os ombros quando invadem este país.

Se Napoleão afirma que a melhor infantaria de toda a Europa é a portuguesa, como se pode entender que Portugal não tenha resistido? Ninguém deu a ordem. É essa ainda hoje a nossa maior fragilidade.

As lições das invasões francesas, infelizmente, não foram apreendidas. Eis algumas delas: um exército não se improvisa do dia para a noite, as ideologias nem sempre se coadunam com a matriz nacional, as leis devem ser adequadas às pessoas a quem se aplicam, o desenvolvimento sustentado é preferível para não se gastar mais do que o que se produz, pois quando dobramos a cerviz, mas depressa mostramos o fundo das costas.

Como há 200 anos, Portugal resiste em aprender a saber estar, a saber fazer e saber prever.

Monday, November 2, 2009

Gondoriz: na margem do rio Homem



"Entre o Homem e a Amarela — Gondoriz" pode significar o regresso de Manuel da Silva Martins à sua terra natal, que deixou ainda criança, realizando uma monografia completa sobre esta freguesia do concelho de Terras de Bouro que a Calidum editou agora.

Integrada na colecção "Cadernos de Cultura", da Câmara Municipal de Terras de Bouro que está empenhada na edição de obras do grande impulsionador da florestação da serra do Gerês e estudioso das tradições e usos dos povos serranos, Tude de Sousa, pretende dar resposta a uma lacuna pois Gondoriz era uma das freguesias cuja história mais se desconhecia e "ninguém imaginava que pudesse dar origem a um volume desta grandeza" — refere António ferreira Afonso.

Com 412 páginas, Manuel Martins — "sem pretensões a arqueólogo ou etnólogo" — assinala da melhor forma o regresso das suas lides de Lisboa à terra Natal, cujo nome germânico significa chefe de combate, estudando os seus lugares e as casas mais importantes, as capelas, as tradições, o património imaterial das lendas e crenças deste povo encarregado de defender a "porta da Amarela", desde o século XIII.

Situada na margem direita do rio Homem, Gondoriz encerra um "passado antiquíssimo de grande importância que valoriza o concelho" de Terras de Bouro e a obra de Manuel Martins faz sair esta terra do "asfixiante anonimato a que tinha sido arremessada", sem receio do erro porque se está sempre pronto a corrigí-lo, como escreve o autor no prefácio.

Esta monografia é o resultado de muitas leituras — devidamente citadas — que contribuem para dar fundamento científico ao autor que se socorre dos grandes historiadores das coisas do Minho, com destaque para Avelino Jesus da Costa, José Marques e Arlindo Cunha, para se situar no antigo Julgado de Regalados, no séc. XII, momento a partir do qual os documentos escritos são mais frequentes.

Só com a reforma de Mouzinho da Silveira, em 1836, Gondoriz integra o concelho de Terras de Bouro.
O texto é acompanhado de documentos e fotografias que credibilizam as palavras de quem prova que conhece bem a sua terra e as freguesias vizinhas, algumas delas absorvidas por Gondoriz, como Gomesende e São Cristóvão.

Gondoriz, intimamente ligada à serra Amarela, está em perda de população depois de já ter sido habitada por 660 pessoas na década de 50 do século passado, estando hoje reduzida a metade que vai conservando alguns usos e tradições seculares. Destacam-se a religiosidade, as tradições pascais, as romarias e os clamores, confrarias e ditados populares, receitas medicinais como colocar um colar de alhos ao pescoço da criança com lombrigas.

Um glossário típico de Gondoriz e documentação (fotos e biografia) diversa concluem este livro escrito por um economista e técnico superior das alfândegas e dos impostos especiais sobre o consumo, actualmente aposentado, que também foi professor em Lisboa.

Franceses em Braga há 200 anos (22)


Não podemos reduzir a passagem das tropas francesas pelo Minho há 200 anos às batalhas ou aos saques e mortes causadas pelas tropas de Soult, durante a segunda invasão, nem separar esta das restantes. Os efeitos destas invasões bem se podem catalogar como um longo calvário para a Nação portuguesa.

Portugal foi o primeiro território de afrontamento entre dois grandes líderes militares europeus, antes do encontro final de Waterloo. O Minho foi também um território onde Wellington praticou - através dos seus chefes militares Wellesley ou Beresford - a política da terra queimada: 50 mil portugueses morreram de fome, durante os cinco meses de cerco de Massena nas linhas de Torres Vedras.

As invasões francesas marcaram de tal forma este país que ainda se mantêm hoje os seus efeitos. A análise demográfica aponta para a perda de dez por cento da população portuguesa, quer pela força das armas, quer pelas doenças, pela fome e frio. Foram cerca de 300 mil portugueses que morreram, um número inimaginável hoje quando somos quatro vezes mais.

A nossa agricultura e pecuária foram arrasadas, os monumentos roubados, as igrejas profanadas, cidades e vilas incendiadas, pontes e outras obras de arte destruídas, população deslocada. Atrás das linhas de Torres estiveram 600 mil portugueses!

A presença de mais de 25 mil militares de Napoleão deixou marcas no nosso Minho, muito para além da destruição e saque de edifícios do nosso património. Basta evocar o ditado "tudo como dantes, quartel em Abrantes" ou aquele que "come à grande e à francesa" ou passa a vida a "ver navios". São expressões que ficaram por cá.

Para além da nossa linguagem, as invasões francesas tiveram profundas consequências na maneira de pensar dos portugueses, especialmente o ideário político liberal e a introdução das bases administrativas de um estado moderno.

Há quem afirme que os exércitos de Soult, Junot e Massena foram os parteiros da modernidade política, organizacional e até constitucional. A monarquia portuguesa, cujo titular se refugiou no Brasil, foi "atacada" por um constitucionalismo moderado, em que a figura do rei vai perdendo terreno. A influência política foi muito mais forte que o descalabro causado pelas armas ou pelos militares.

A imposição das ideias da revolução francesa num país ainda quase feudal, deram origem a divisões profundas na família real e nas elites que derivaram para uma guerra civil de quase cem anos que só terminou em 1933 com uma nova Constituição.

Se é verdade que as invasões semearam ódios profundos do povo contra os franceses, não é menos certo que semearam novas aspirações e ideias, anseios de reivindicações sociais que desabrocharam depois. A revolta da Maria Fonte só pôde ser possível se a entendermos como consequência da invasão francesa.

Mais grave que as malfeitorias dos militares franceses e foram muitas, os ingleses que eram aliados portugueses contribuíram para a desertificação e para o ruinoso tratado comercial de 1810 que concluiu a aniquilação económica de um país, sem rei, nem roque.

Foi um país sem rei nem roque que abriu as portas a estas invasões francesas, sem ter "boas tropas e bons navios" face à ameaça de Napoleão em toda a Europa e depois da aventura desgraçada do Roussilhão que levou à perda de Olivença.

Este país sem ideias e identidade facilmente se atordoou com a dinâmica exportadora de ideologia francesa, após a subida o poder de Napoleão que transformou cada soldado num cidadão e cada cidadão num soldado. Até a amiga Inglaterra nos menorizou quando o primeiro ministro William Pitt respondeu: "O governo de sua Majestade só ajuda os Governos que, em primeiro lugar, se queiram ajudar a si próprios". Era o que Portugal não sabia fazer, ajudar-se a si próprio.

A lição que fica para a história parece não ter sido aprendida: as cúpulas erram e quem paga os erros é o povo porque a Corte fugiu, literalmente, acompanhada de dez a quinze mil nobres e burgueses, com todas as riquezas que puderam transportar.

Como foi possível isto ter acontecido?

A esta e outras perguntas vamos tentar responder na próxima crónica e confirmar que mantêm uma flagrante actualidade, 200 anos depois.