Monday, September 29, 2008

Costa Lopes: Trovadores, Camilo e IMA perdem um amigo




Os trovadores medievais, os estudos camilianos e a filosofia perderam um dos seus maiores amigos e divulgadores: o professor doutor António da Costa Lopes, que faleceu Domingo no Lar Conde de Agrolongo.

Chegava ao fim da peregrinação de um padre, de um homem, de um professor, de um investigador, de um amante das artes do teatro e da música que nunca se deixou mergulhar nos “vulcões da lama”.

A poucos dias de completar 80 anos — que celebrava no dia 23 de Outubro — este barcelense doutorado em Filosofia pela Universidade Gregoriana de Roma, na década de 50, deixou a sua marca indelével em milhares de alunos que passaram pelos Seminários de Braga e pela Universidade Católica Portuguesa (Instituto Superior de Teologia e Faculdade de Filosofia de Braga), através das suas aulas de Teoria do Conhecimento.

Apaixonado pela música, pela literatura portuguesa e pela Filosofia, o prof. António da Costa Lopes deixa o seu nome indelevelmente ligado ao Instituto Monsenhor Airosa de que foi director durante trinta anos (1969-1999). Ali foi enriquecendo o seu espólio bibliográfico nas áreas da música, da literatura medieval e camiliana, bem como na dinamização do ensino das artes às jovens que aquela Instituição acolhia, através do teatro e da música.

O Minho perde um grande pedagogo da juventude feminina e um dos maiores investigadores da poesia trovadoresca, especialmente dos cantores e poetas medievais nascidos no Minho, especialmente na sua terra (Barcelos) e em Famalicão.

Esta foi uma as suas predilecções ao longo de toda a sua vida, especialmente desde que descobriu a possibilidade que confirmou a naturalidade de João de Guilhade.

A Gil Vicente, Soren Kierkegaard, o polaco Emile Meyerson (o seu filósfo preferido), o pessimista António Feijó e o monismo de Leibniz uniu a sua afeição pela vida e obra de Camilo Castelo Branco.

Esta foi fomentada pela presença de Ana Plácido, no fim do século XIX — nas instalações que hoje são ocupadas pelo Instituto Mons. Airosa, permitiu a publicação de edições críticas de alguns inéditos camilianos sem se deixar contaminar “pela gangrena das materialidades e a subversão dos sentimentos nobres”.

Pela sua sabedoria e competência, foi escolhido para o cabido da Sé de Braga em 1967 onde teve e seu cargo a tarefa de revisão dos livros litúrgicos da diocese de Braga.

Pode dizer-se, com o mesmo rigor que ele cultivava escrupulosamente nos textos que publicou, que morreu embrenhado nos seus livros e nos seus escritos que, como poucos, fizeram a ponte cultural entre o Minho e a Galiza onde passava longas temporadas a investigar as raízes da poesia medieval galaico-portuguesa.

Braga deve sentir-se agradecida e manifestar esta gratidão a este barcelense que dignificou a sua produção cultural, enquanto a Igreja se pode sentir feliz por o ter tido dentro de si como requintado servidor.

Lá onde está, de certeza junto de Deus, padre Costa Lopes, não leva a mal que revele aqui um segredo: já temos saudades daquelas garrafas de licor da Galiza com que nos prendava. Fazia isso com toda a amizade, quando nos encontrávamos para dar mais um inédito para publicar no Correio do Minho e lembrarmos as aulas de Teoria do Conhecimento e os espectáculos musicais do Instituto Monsenhor Airosa.

Da nossa parte, fomos felizes enquanto nos enriqueceu com os seus livros e artigos. Dentro de dias, vamos publicar no Correio do Minho o último que nos trouxe. Foi o seu abraço camiliano a dizer-nos “até já”.

S. Geraldo — 900 anos da sua morte (2)


Para percebermos a importância de S. Geraldo para Braga, o norte de Portugal e o nascimento de Portugal enquanto país, temos de recuar no tempo.
Devidamente enquadrada a sua figura, o seu valor ainda se destaca mais aos olhos dos que vivem neste século XXI em que se celebram os 900 anos da sua morte.

O cristianismo, quando entrou na Península Ibérica — de que Braga era um dos maiores pólos urbanos e centro de difusão cultural — encontra um lastro religioso de muitos séculos cuja matriz era a multiplicidade de deuses e de cultos.

Os berços religiosos da Galécia situam-se antes dos romanos cá chegarem, mas estes pensaram que por cá não se prestava culto aos deuses, dada a inexistência de templos e de imagens, como escreveu Estrabão na sua “Geographia”.
Os habitantes da Galécia veneravam os seus deuses juntoa a rios e fontes, sem templos, de que é exemplo máximo a Fonte do Ídolo em Braga.

É a romanização que leva os habitantes da Galécia à construção de templos e com eles à alteração da prática da religião, embora os deuses indígenas tenham começado a desaparecer com a chegada de Fenícios, gregos e cartagineses.

Com a romanização acontece também que a um deus romano era dado um nome indígena, o que traduz a resistência dos autóctones da Galécia às divindades trazidas pelos romanos. Por exemplo, em Vilar de Perdizes, o culto ao deus Larouco fundiu-se com o de Júpiter, o que também pode querer significar que Roma não quis impôr aos habitantes da Galécia os seus deuses.

Sabe-se que o culto de Júpiter foi o mais difundido entre nós, sobretudo nas cidades, mas subsistiam devoções a Serápis ou à egípcia Ísis, enquanto não chegavam as ondas do culto ao Imperador.

O cristianismo terá chegado á península Ibérica no séc. II- S. Irineu de Lião, na sua “Adversus Haereses”, escrita em 188, fala das igrejas da Ibéria ao destacar o seu fervor no combate às heresias.

Tertuliano, duas décadas depois, alude ao cristianismo espalhado por todo o mundo incluindo os “hispaniarum omnes termini”, sobretudo trazido pelos comerciantes, navegadores e soldados. Outra prova consiste na perseguição de Diocleciano, no ano 303, que faz muitos mártires nas cidades lusitanas, sobretudo nas cidades.

A escassez documental torna quase impossível descrever a chegada do cristianismo à Península Ibérica, apesar das lendas referentes a S. Tiago, apesar dos esforço para relacionar o cristianismo ibérico com os tempos dos Apóstolos (Rom. 15, 24).

O documento mais antigo refere-se à Galécia mas sabe-se que o cristianismo chegou mais depressa e mais cedo ao sul da Península Ibérica. O Concílio de Elvira testemunha isso mesmo em meados do século III, separando judeus de cristãos e cristãos de pagãos. Quando Teodósio oficializa o cristianismo, em 394, começa a adaptação dos templos romanos à nova religião e dava-se às antigas práticas religiosas um novo sentido.

Uma vez que a Norte a romanização não fora tão forte, nos século V dá-se a entrada dos povos suevos e visigóticos, uns mais a norte e outros na Lusitânia.

É por esta altura que surge em Braga Paulo Orósio com a sua “Historiarum adversus paganos”, a primeira tentativa de elaborar uma filosofia cristã da História. Expurgar os cultos pagãos eram um dos objectivos desta obra, mas eles iam subsistindo sobretudo entre as gentes do campo que continuavam a rezar-lhes nos montes, nos bosques, nos rios e nas fontes. As fontes miraculosas são cristianizadas com a concessão do nome de um santo.

O “paganus” era o habitante do campo que se mantinha fiel ao politeísmo em contraponto ao habitante urbano monoteísta.

Saturday, September 20, 2008

Braga: Geraldo de Moissac morreu há 900 anos


Geraldo de Moissac, nasceu numa família nobre, muito religiosa, na Diocese de Cahors, em França.

Mas sabe-se que o então jovem Geraldo professou na Abadia Clunycence de Moissac . Foi um erudito, com uma grande cultura e é considerado o grande arcebispo que reorganizou a cidade de Braga. Morreu no dia 5 de Dezembro de 1108 e esta série de artigos que hoje inciamos tem o humilde objectivo de assinalar os novecentos anos da sua morte. É um tema que não interessa apenas aos bracarenses, mas a todos os minhotos, uma vez que ele foi um dos grandes arcebispos de uma diocese que ia desde o rio Ave até ao rio Minho e “mergulhava” em terras transmontanas.

Hoje sintetizamos apenas alguns dados sobre a sua vida e obra mas é nossa intenção trazer aqui o antes, o durante e o depois do espiscopado desenvolvido por S. Geraldo. digno herdeiro de prelados como S. Frutuoso ou S. Martinho de Dume.
Em 1096 é nomeado Bispo, Arcebispo de Braga, tendo-se empenhado em elevar o nível cultural, religioso e moral do clero e do povo.

Durante 12 anos apoiou o conde D. Henrique, foi 2 vezes (em 1100 e 1103) a Roma, uma delas acompanhando o conde. Assim, este homem da Igreja é um dos "pioneiros" da fundação de Portugal, através de esforços para obter junto de Roma a restauração da metrópole (Arcebispado de Braga), com autonomia eclesiástica, assumindo assim uma dimensão que ultrapassa os muros da ‘civitas bracarensis’.

É o padroeiro de Braga que celebra a sua festa no dia da sua morte, a 5 de Dezembro de 1108 e está sepultado na Capela de São Geraldo na Sé Catedral de Braga.

Assinalam-se-ão, pois, em 2008, os 900 anos da morte do Padroeiro de Braga e nós, além de lembrar esta eminente figura de Braga, queremos alertar boas vontades para condignas celebrações.

A evocação do Padroeiro de Braga deve servir também para evocar a ligação íntima da sua História — passado, presente e futuro — ao papel que vem sendo assumido pela Igreja, enquanto motor do desenvolvimento do Concelho nas mais diversas vertentes, ao longo dos últimos 900 anos.

A primitiva Capela de São Geraldo, da qual apenas resta a estrutura das paredes, foi mandada construir pelo arcebispo Geraldo de Moissac, em honra de são Nicolau.

Em 1418-1467 o arcebispo D. Fernando da Guerra, depois de Geraldo ser considerado santo, dedicou a Capela a este arcebispo de Braga, e o santo sepultado no retábulo principal.

A capela está decorada em talha barroca. Os azulejos são atribuídos ao pintor António de Oliveira Bernardes (1662-1731). No dia da festa, o altar fica repleto de fruta, numa alusão aos seus últimos momentos de vida.

S. Geraldo, o organizador da cidade de Braga depois do período da reconquista, “no cumprimento do seu dever pastoral e nobre desempenho da sua missão”, já doente, arrastou-se até Bornes, concelho de Vila Pouca de Aguiar, onde consagrou a Igreja, pregou e administrou o Sacramento do Crisma, “ e no dia 5 de Dezembro de 1108, reunidos os padres da sua comitiva, deu-lhes a bênção, ouviu Missa, comungou e morreu, voando a sua alma gentil ao céu, para viver com Deus”.

Assim Mons. José Augusto Ferreira descreve nos “Fastos” a morte de S. Geraldo. Acontecida no dia 5 de Dezembro de 1108.
Os tempos são outros e os âmbitos de intervenção alteraram-se. O tempo do Senhorio dos Arcebispos está, graças a Deus, ultrapassado mas resta o dever de rever o relacionamento entre o poder político e o serviço religioso. ecomo natural e humana, esta proposta eclesial.

Esta série de textos que hoje iniciámos apenas pretende contribuir, dentro do possível, para que todos os bracarenses e minhotos se preparem para celebrar — como deve ser — os 900 anos da morte de S. Geraldo e delas se retirem abundantes frutos para toda a comunidade minhota.
Ou nós não conhecemos — e perdoem-nos a ignorância — ou a Igreja, a autarquia e as instituições de Braga não têm apetite para assinalar esta data emblemática do passado da Roma Portuguesa.

D. Antonino Dias: a sorte de Portalegre e Castelo Branco


Na hora da despedida, o bispo auxiliar de Braga, D. Antonino Dias reconhece que “somos uma Igreja de muito culto e às vezes pouca cultura na Fé; o culto também é uma expressão da Fé mas penso que a grande aposta é a cultura da Fé”.

Braga fica com saudades desde servidor da Igreja que nos deixa a herança da sua lição diária de alegria serena, simplicidade e preocupação com os problemas dos seus padres. Vai ser a sorte dos fiéis e dos padres de Castelo Branco e de Portalegre.

Em jeito de balanço “muito positivo” a esta nova passagem por Braga D. Antonio Dias destaca “toda a riqueza que recebi no contacto com o sr. Arcebispo, os bispos auxiliares e sobretudo com o clero que foi sempre muito delicado, atencioso e pela forma como sensibilizavam o povo para as visitas pastorais e como o povo nos acolhiam”.

“É muito positivo aquilo que sinto” — assegura D. Antonino Dias na hora da despedida da Dioceses de Braga depois de ser nomeado bispo de Portalegre e Castelo Branco, a partir de 7 de Outubro.

“Eu corri a arquidiocese toda uma vez e já ia perto do fim da segunda ronda de visitas pastorais e causou incómodo esta mudança porque o arciprestado de Braga já tinha tudo programado e delineado a contar comigo” — recorda o novo Bispo de Portalegre e Castelo Branco, nascido em Longos Vales, Monção.

Há uma zona da arquidiocese que está em desertificação e há outra a faixa litoral que cresce (“a que me estava atribuída territorialmente”) — acrescenta o bispo auxiliar de Braga, em entrevista à rádio de Braga Antena Minho, emitida no programa “Sinais — a religião é notícia”.

Fazendo um retrato religioso da diocese de Braga, o prelado refere que “somos uma zona de muito culto e às vezes pouca cultura na Fé; o culto também é uma expressão da Fé mas penso que a grande aposta é a cultura da Fé, como defende o senhor Arcebispo e está a ser feito”.

“Uma Fé um pouco tradicional, que às vezes parece que não é uma opção radical da pessoa mas por que vem pda tradição” — é assim que D. Antonino define grande parte do comportamento religioso mas admite que as coisas estão a mudar.
Uma das marcas do seu episcopado foi uma ligação estreita com os padres, sendo um bispo muito próximo dos seus padres.

Daí que ele conheça bem as maiores inquietações dos sacerdotes: “aquilo que mais admirei foi a unidade e comunhão do clero mas aquilo que mais me preocupa é quando algum padre se afasta de viver com os outros padres, deixa de participar nas actividades com outros , deixar de fazer formação permanente, se coloca um pouco à margem. Isso não é um bom sinal e muitas vezes é um sinal de que outras coisas estão acontecer na vida do padre. Queremos muitas vezes ir ao seu encontro mas há sempre uma resistência quando se chega a determinado de viver e de estar que é difícil de contrariar. Mais tarde vão se arrepender mas...”

Para D. Antonino Dias, a solidão dos padres não é o problema porque um”padre não tem o direito de dizer que vive na solidão. O padre só está só se quiser e só sente a solidão se quiser. Esse é o perigo, o padre isolar-se dos outros e de Deus. Quem crê nunca vive só e se isso é verdade para qualquer pessoa, muito mais para um sacerdote.”

Nas suas visitas, D. Antonino Dias reconheceu situações de grande fragilidade de alguns padres pois “admirava como é que alguns senhores padres, com paróquias pequeníssimas, com pouca gente, ali passaram uma vida inteira, com uma austeridade que me surpreendia. São heróis e exercem um autêntico sacerdócio na multiplicidade dos sentidos”.

D. Antonino Dias recebe a nomeação para o alto Alentejo como surpresa pela altura em que foi nomeado, quando novo ano pastoral está em marcha e quanto ao local, porque esperava que fosse escolhida outra pessoa que conhecesse melhor Portalegre e Castelo Branco.

Na romaria de Porto d’Ave, D. Antonino Dias lançou a “ameaça da explosão de uma bomba social no distrito de Braga”: “preocupa-nos muito a situação económica das família, porque ela é geradora de instabilidade e aqui e no Alto Minho todos os dias vimos fábricas a fechar. Há pessoas que não gostem que se fale nisto mas há certas realidades que a dimensão profética da Igreja não pode ser ignorada. O que eu disse em Porto d’Ave, nem são dados meus, são da União de Sindicatos de Braga — que tem feito um grande trabalho nesse sentido — foi confirmado pelas Instituições de Solidariedade Social. Estamos prestes a que, em Braga, estoure esta bomba social. É uma situação difícil e não se prevê que esteja a desanuviar. Dá impressão que vão vir tempos mais escuros mas tem de haver esperança. Temos de reagir e agir contra a situação, para acém de agradecer àqueles que são capazes de investir para criar novos empregos e procurar a solidariedade de uns com os outros, nas paróquias temos de ser cristãos e ajudar quem precisa”.

Aos “meus parceiros, os padres”, D. Antonino deixa uma palavra de gratidão — “por tudo quanto fizeram e pela sua gentileza e delicadeza que tiveram sempre comigo, e que não desanimem” — e um convite: “Portalegre e Castelo Branco não são sítios turísticos mas passem por lá para recordarmos os momentos bons que aqui vivemos”.

Guadalupe: Braga é uma cidade mais feliz



Braga é uma cidade mais feliz e com mais vida, porque este fim-de-semana, um dos seus pulmões, o Parque de Guadalupe voltou a ter vida em abundancia, ao acolher as festas de São Marçal (padroeiro dos Bombeiros) e Nossa Senhora da Piedade ao fim de três décadas de silêncio e apagada vil tristeza.

Quem proporcionou nova vida e alegria ao parque de Guadalupe merece o reconhecimento dos bracarenses.
A Confraria de Nossa Senhora da Guadalupe, a Jovem Cooperante Natureza/Cultura e a Rusga de S. Vicente são os culpados desta bonita iniciativa que tanta falta faz ao coração de Braga para bater com mais ânimo e mergulhar nas suas raízes.

Por iniciativa daquelas entidades, com apoio da Junta de Freguesia, durante este fim-de-semana, o parque de Guadalupe voltou a acolher um leque de actividades de cariz popular e religioso, que noutros tempos marcaram o ritmo da vida daquela parte alta da cidade.

Outra das tradições retomadas que merece o aplauso é a adesão dos bombeiros voluntários à festa do seu padroeiro, dando um invulgar colorido às ruas de Braga na manhã de Domingo, com o andor do padroeiro.

No coração da cidade vibraram de novo tradições que apenas se vão recuperando e vivendo nas aldeias, como são os jogos populares da lata, corrida do saco e quebra do púcaro e ouviram-se os ritmos dos Bombos da Rusga de S. Vicente, os acordes da grande ‘Tuna FP’, as vozes melodiosas do grupo de fados e música tradicional e os sons populares da Rusga de S. Vicente.



O regresso das festas de S. Marçal ao parque de Guadalupe resulta sobretudo da união de boas vontades de várias agremiações e constitui um bom exemplo de que a união de esforços tem muita força e pode proporcionar coisas fantásticas em Braga.

Se outras colectividades derem as mãos, as festas de S. Marçal podem adquirir mais fulgor no próximo ano. Oxalá não falte o engenho e a arte de mais alguns para fazerem forte uma tradição que anima o coração da Cidade dos Arcebispos e estava em risco de morte.

São iniciativas como esta que dão vida em abundância e colorido alegre aos cinzentos e envelhecidos centros históricos das cidades, cada vez mais conhecidos por serem um amontoado de prédios sem vida e sem raízes culturais.

Fernando Tordo: um cicerone de Braga


Às vezes damos connosco a perguntar qual será a razão que explica tão pouca auto-estima dos bracarenses que valorizam tão pouco aquilo que tem dentro da sua cidade e no seu concelho.

Comparativamente com outras cidades de Portugal, os bracarenses não manifestam o orgulho e vaidade que Braga e as suas instituições deviam merecer, a começar pela brilhante noite de futebol europeu proporcionada ontem pela equipa de futebol do Sporting de Braga.

Entre as cinco equipas portuguesas participantes na Taça UEFA, a equipa arsenalista foi a que mostrou melhor perfomance numa competição de elevado nível de exigência.

E, no entanto, quantos espectadores estavam no Estádio Municipal de Braga para ver a sua equipa a defrontar um clube que há dois anos venceu o F. C Porto no Estádio das Antas para a Liga dos Campeões?

Numa noite em que o jogo nem tinha transmissão televisiva, tem de admitir-se que menos de dez mil espectadores, num concelho com 170 mil habitantes, constitui uma marca que não deixa ninguém satisfeito.

A insatisfação deve começar pela direcção do Clube — com cerca de 15 mil associados — que este ano está afazer um grande investimento para que o Sporting minhoto tenha uma equipa de topo nacional e de top europeu.

Uns dirão que a maioria dos bracarenses não se pode dar ao luxo de pagar trinta euros para ver um jogo e que a Direcção desconhece a frágil realidade económica das famílias. Outros dirão que Braga não é só futebol. É verdade mas também aí não falta quem dê o verdadeiro valor àquilo que Braga possui e as suas instituições públicas e privadas desenvolvem.

Por isso, sabe bem ouvir pessoas esclarecidas como o grande compositor e cantor Fernando Tordo que veio a Braga classificou o Teatro Circo como o “mais belo do pais”. Alguns bracarenses com responsabilidades, perante estas realidades, preferem o silêncio, deitar mão dos pormenores para ensombrar o essencial ou — se fosse eu a escreve-lo, diziam que eu era um escriva vendido a dar eco à voz do dono.

Mais, também devia aumentar a auto-estima dos bracarenses ouvir um grande senhor da musica portuguesa destacar o talento de dois grandes músicos bracarenses, como os Josés Sarmento e Talaia. Mais ainda, que este grande senhor da musica lusitana lhes dedique um concerto com orquestra no dia 4 de Outubro, no mais belo teatro do pais.

Mas ainda aproveitamos mais uma achega de Fernando Tordo para ajudar os bracarenses a gostarem mais da sua cidade. Ele disse — e citamos, do alto dos seus 43 anos de carreira — “Braga é uma cidade da linha da frente em termos culturais”.

Gostaram? Eu amei e fico a torcer para que os bracarenses amem mais a sua cidade, o que ela tem, os filhos que gerou e as instituições que lhe dão vida com uma qualidade que devia merecer mais reconhecimento íntimo dos bracarenses.

Em vez de se desgastarem em criticas mesquinhas, invistam o tempo a saborear o que Braga tem para oferecer e é muito. Basta abrir os olhos porque é uma pena que tenham de ser os forasteiros a desempenhar o papel de cicerones daquilo que teimamos em não querer saborear porque não queremos ver.

João dos Anjos: a alma da "Confiança"


João dos Anjos é quase uma emblema da Confiança, fábrica de perfumaria e saboaria, mítica fábrica confiança, se calhar uma das mais lucrativas em Braga na primeira metade do século XX e continua a laborar embora “amputada de certos produtos”.

Num tempo de competitividade feroz, a Confiança de hoje continua a fabricar “bons produtos, como há 50 anos, em que eram apreciados no mercado português e lá fora” e a vida de João dos Anjos confunde-se com a história da empresa.
João dos Anjos destaca os perfumes TS ou Veleiro, com uma base de alfazema que é muito agradável quer para senhora quer para homem e nos sabonetes o Alfazema”.

Nasceu na rua Nova de Santa Cruz em 1894, e João dos Anjos testemunhou os momentos altos desta empresa que chegou a produzir oito mil caixas de perfume por mês e quatro mil caixas de sabonete por mês, em finais da década de 30. Pastas dentífricas e pó de arroz eram também fabricados nesta empresa cuja marca social é notável com assistência medica aos trabalhadores e seus familiares bem como salário integral mesmo que o trabalhador faltasse por doença.

João dos Anjos começou a sua vida de 60 anos ao serviço da Confiança aos 11 anos, a 7 de Outubro de 1932, quando completou a quarta classe (“era quase um doutro naquele tempo”). “Fui para atender o telefone mas ele nem sempre tocava naquela altura e ia vagueava pela fábrica nos sectores de actividade desde sabão, sabonete, pó-de-arroz, pasta de dentes a perfumes, e essa atenção resultou. Eu 1944 eu sabia tudo e comecei a estar ligado a todos os produtos que saíam da Confiança”.

“Comecei a fazer de tudo e de nada. Até fazia caixas para sabão. Naquele tempo o sabão não era feito a vapor, mas a fogo directo que punha as gorduras a ferver. Comecei a fazer sabão” — recorda João dos Anjos o homem que estreava todas as máquinas novas que chegavam à Confiança.

“Eu fazia tudo o que havia dentro da Confiança, compor uma água de colônia, fazer a base dos sabonetes, porque era o mais importante porque agora as bases vêm feitas, são importadas” – acrescenta.

Entre as muitas histórias, João dos Anjos como os períodos difíceis da empresa como foi a chegada a Portugal do sabão de Offenback, em cores rosa (de Coimbra para cima) e azul (de Coimbra para baixo) e o nascimento da CUF que fabricava um sabão que “era uma maravilha para as lavadeiras”. Não havia lixívias e o sabão era rei e a “única coisa que tirava nódoas era o sol, era corar”.

“O TS é uma criação minha, um compunha os perfumes que levavam três ou quatro essências, entre elas a rosa da Bulgária que é caríssima. Cheira tão mal tão mal mas dá um aroma e fixação que é difícil de sair.

O contacto permanente com os perfumes era tal que “em minha casa ninguém comia nada daquilo onde eu punha a mão. A minha bata estava sempre suja”. Eu estava em toda a parte da fábrica.

A Confiança tinha três sectores principais: o do sabão, dos sabonetes e dos perfumes. Dentro deste, tinha as pastas de dentes, o creme de barbear (“fui eu que criei o Belopele e depois TS e depois Veleiro”).

A década de trinta foi a altura de maior modernização da Confiança, seguindo-se anos de grande esplendor. “Nós tivemos nessa altura uma creche e um medico para os trabalhadores e suas famílias. O medico dava baixa e a empresa pagava os dias de baixa como se os trabalhadores viessem trabalhar”.

Entre os visitantes ilustres, João dos Anjos lembra-se de várias visitas do presidente da Câmara e até do Marcelo Caetano.
“Eu estava em toda a parte a acompanhar a visita do presidente do Conselho, recorda João dos Anhos. Explicando ao governante como funcionava e o que produziam as máquinas, ao ponto de Marcelo ter desabafado para os donos da fábrica: “este rapaz está em toda a parte”.

Aposentado há 17 anos “sofre com a possibilidade do desaparecimento da Fábrica Confiança. Eu saí em 1992, com 60 anos de trabalho” e recorda ainda o último trabalho que fez: “inaugurar a linha mais moderna de tiragem de sabonetes, que tinha ido comprar a Espanha, que ainda hoje funciona com qualidade e é do melhor que há na Península Ibérica.”

A nossa conversa com João dos Anjos que “nunca teve horário de trabalho” não termina sem homenagem aos seus companheiros de trabalho porque ainda hoje, quando acorda tarde, fica preocupado porque “vai chegar atrasado à fábrica”.
“Sempre foram gente muito honesta, gente muito séria e grandes trabalhadores” — conclui João dos Anjos, um grande apreciador do fado.

Braga: Geraldo de Moissac morreu há 900 anos


Geraldo de Moissac, nasceu numa família nobre, muito religiosa, na Diocese de Cahors, em França.

Mas sabe-se que o então jovem Geraldo professou na Abadia Clunycence de Moissac . Foi um erudito, com uma grande cultura e é considerado o grande arcebispo que reorganizou a cidade de Braga. Morreu no dia 5 de Dezembro de 1108 e esta série de artigos que hoje inciamos tem o humilde objectivo de assinalar os novecentos anos da sua morte. É um tema que não interessa apenas aos bracarenses, mas a todos os minhotos, uma vez que ele foi um dos grandes arcebispos de uma diocese que ia desde o rio Ave até ao rio Minho e “mergulhava” em terras transmontanas.

Hoje sintetizamos apenas alguns dados sobre a sua vida e obra mas é nossa intenção trazer aqui o antes, o durante e o depois do espiscopado desenvolvido por S. Geraldo. digno herdeiro de prelados como S. Frutuoso ou S. Martinho de Dume.
Em 1096 é nomeado Bispo, Arcebispo de Braga, tendo-se empenhado em elevar o nível cultural, religioso e moral do clero e do povo.

Durante 12 anos apoiou o conde D. Henrique, foi 2 vezes (em 1100 e 1103) a Roma, uma delas acompanhando o conde. Assim, este homem da Igreja é um dos "pioneiros" da fundação de Portugal, através de esforços para obter junto de Roma a restauração da metrópole (Arcebispado de Braga), com autonomia eclesiástica, assumindo assim uma dimensão que ultrapassa os muros da ‘civitas bracarensis’.

É o padroeiro de Braga que celebra a sua festa no dia da sua morte, a 5 de Dezembro de 1108 e está sepultado na Capela de São Geraldo na Sé Catedral de Braga.
Assinalam-se-ão, pois, em 2008, os 900 anos da morte do Padroeiro de Braga e nós, além de lembrar esta eminente figura de Braga, queremos alertar boas vontades para condignas celebrações.

A evocação do Padroeiro de Braga deve servir também para evocar a ligação íntima da sua História — passado, presente e futuro — ao papel que vem sendo assumido pela Igreja, enquanto motor do desenvolvimento do Concelho nas mais diversas vertentes, ao longo dos últimos 900 anos. Autarquia, Igreja e forças vivas andam distraídas ou não sabemos o que estão a preparar?

A primitiva Capela de São Geraldo, da qual apenas resta a estrutura das paredes, foi mandada construir pelo arcebispo Geraldo de Moissac, em honra de são Nicolau.
Em 1418-1467 o arcebispo D. Fernando da Guerra, depois de Geraldo ser considerado santo, dedicou a Capela a este arcebispo de Braga, e o santo sepultado no retábulo principal.

A capela está decorada em talha barroca. Os azulejos são atribuídos ao pintor António de Oliveira Bernardes (1662-1731). No dia da festa, o altar fica repleto de fruta, numa alusão aos seus últimos momentos de vida.

S. Geraldo, o organizador da cidade de Braga depois do período da reconquista, “no cumprimento do seu dever pastoral e nobre desempenho da sua missão”, já doente, arrastou-se até Bornes, concelho de Vila Pouca de Aguiar, onde consagrou a Igreja, pregou e administrou o Sacramento do Crisma, “ e no dia 5 de Dezembro de 1108, reunidos os padres da sua comitiva, deu-lhes a bênção, ouviu Missa, comungou e morreu, voando a sua alma gentil ao céu, para viver com Deus”.

Assim Mons. José Augusto Ferreira descreve nos “Fastos” a morte de S. Geraldo. Acontecida no dia 5 de Dezembro de 1108.
Os tempos são outros e os âmbitos de intervenção alteraram-se. O tempo do Senhorio dos Arcebispos está, graças a Deus, ultrapassado mas resta o dever de rever o relacionamento entre o poder político e o serviço religioso. ecomo natural e humana, esta proposta eclesial.

Esta série de textos que hoje iniciámos apenas pretende contribuir, dentro do possível, para que todos os bracarenses e minhotos se preparem para celebrar — como deve ser — os 900 anos da morte de S. Geraldo e delas se retirem abundantes frutos para toda a comunidade minhota.

Braga: uma cidade mais feliz



Braga é uma cidade mais feliz e com mais vida, porque este fim-de-semana, um dos seus pulmões, o Parque de Guadalupe voltou a ter vida em abundancia, ao acolher as festas de São Marçal (padroeiro dos Bombeiros) e Nossa Senhora da Piedade ao fim de três décadas de silêncio e apagada vil tristeza.

Quem proporcionou nova vida e alegria ao parque de Guadalupe merece o reconhecimento dos bracarenses.
A Confraria de Nossa Senhora da Guadalupe, a Jovem Cooperante Natureza/Cultura e a Rusga de S. Vicente são os culpados desta bonita iniciativa que tanta falta faz ao coração de Braga para bater com mais ânimo e mergulhar nas suas raízes.

Por iniciativa daquelas entidades, com apoio da Junta de Freguesia, durante este fim-de-semana, o parque de Guadalupe voltou a acolher um leque de actividades de cariz popular e religioso, que noutros tempos marcaram o ritmo da vida daquela parte alta da cidade.

Outra das tradições retomadas que merece o aplauso é a adesão dos bombeiros voluntários à festa do seu padroeiro, dando um invulgar colorido às ruas de Braga na manhã de Domingo, com o andor do padroeiro.



No coração da cidade vibraram de novo tradições que apenas se vão recuperando e vivendo nas aldeias, como são os jogos populares da lata, corrida do saco e quebra do púcaro e ouviram-se os ritmos dos Bombos da Rusga de S. Vicente, os acordes da grande ‘Tuna FP’, as vozes melodiosas do grupo de fados e música tradicional e os sons populares da Rusga de S. Vicente.

O regresso das festas de S. Marçal ao parque de Guadalupe resulta sobretudo da união de boas vontades de várias agremiações e constitui um bom exemplo de que a união de esforços tem muita força e pode proporcionar coisas fantásticas em Braga.

Se outras colectividades derem as mãos, as festas de S. Marçal podem adquirir mais fulgor no próximo ano. Oxalá não falte o engenho e a arte de mais alguns para fazerem forte uma tradição que anima o coração da Cidade dos Arcebispos e estava em risco de morte.

São iniciativas como esta que dão vida em abundância e colorido alegre aos cinzentos e envelhecidos centros históricos das cidades, cada vez mais conhecidos por serem um amontoado de prédios sem vida e sem raízes culturais.

Transferências: autarquias subservientes




Seis dos catorze municípios do distrito de Braga assinaram protocolos para a descentralização de competências, passando a assumir novas responsabilidades nas escolas ao nível do 2.º e 3.º ciclos do ensino básico.

A gestão do pessoal não docente, conservação e manutenção dos edifícios escolares e actividades de enriquecimento curricular passam a ser da competência das autarquias que, para o efeito, recebem algumas verbas e ganham com o factor proximidade.

Estas novas atribuições podem ser aprovadas com confiança por acreditar que se vão traduzir em mais benefícios para a escola, para os alunos, e para toda a comunidade educativa.

Com os recursos que as autarquias já têm e com os meios financeiros transferidos, as Câmaras municipais podem prestar um melhor serviço. Continua a ser verdade que um euro investido pelas autarquias tem a rentabilidade de dez euros gastos pela administração central, como afirmava o antigo ministro Valente de Oliveira, indefectível militante da regionalização e da descentralização administrativa das funções do Estado.

Não se pode dizer que tenha sido apenas a maior ou menor sensibilidade para as questões da educação que levou seis câmaras do Distrito de Braga a aceitar a proposta, enquanto as outras oito rejeitaram a proposta do ministério.
É que há muitos municípios que já há vários anos assumem competências que são do Governo central sem as respectivas contrapartidas financeiras.

Acresce ainda que, nesta nova fase de transferência de competências, o Ministério mostra-se um pouco avaro na libertação de recursos para as tarefas que são agora entregues aos municípios.

Como é possível criticar as oito câmaras que não aceitaram ainda as novas competências do segundo e terceiro ciclos do ensino se o ministério da Educação não se chega à frente, entregando às autarquias um envelope financeiro que cubra todas as despesas.

Se é tão bom, por que é que a maioria das Câmaras Municipais não assinou o acordo?
As verbas a transferir não cobrem as despesas e isso só podem entender-se como um acto de subserviência de alguns autarcas ao Terreiro do Paço, justificável pela proximidade de eleições autárquicas.

A manter-se este ritmo de contrapartidas financeiras do poder central, dificilmente outras competências — como na área da saúde — serão aceites pelos municípios. Os município não podem ser sobrecarregados com deveres enquanto o Terreiro do Paço fica com mais dinheiro e menos trabalho.

E isso é que é verdadeiramente mau para o pais e para os portugueses que exigem e merecem um poder político de proximidade. Os presidentes de Câmara não se deram ao respeito, penalizando os cofres municipais e aliviando os da Ministra da Educação.

A proximidade dos gestores políticos dá a estes mais responsabilidade e garante mais qualidade dos serviços do Estado mas também é verdade que Maria de Lurdes Rodrigues fez um bom negócio e os autarcas foram incompetentes na negociação das verbas. Ou foi subserviência? Ou as duas coisas, ou que é duplamente mau para os munícipes e a comunidade escolar.

D. Antonino Dias: a sorte de Portalegre e Castelo Branco


Na hora da despedida, o bispo auxiliar de Braga, D. Antonino Dias reconhece que “somos uma Igreja de muito culto e às vezes pouca cultura na Fé; o culto também é uma expressão da Fé mas penso que a grande aposta é a cultura da Fé”.
Na hora do adeus a Braga onde serviu desde 2001, este bispo deixa saudades, especialmente entre os padres da Arquidiocese que lhes prestaram uma singela mas singular homenagem. As saudades de muitos bracarenses são a sorte dos cristãos e padres de Castelo Branco e Portalegre que o vão ter a partir de Outubro.

Em jeito de balanço “muito positivo” a esta nova passagem por Braga D. Antonio Dias destaca “toda a riqueza que recebi no contacto com o sr. Arcebispo, os bispos auxiliares e sobretudo com o clero que foi sempre muito delicado, atencioso e pela forma como sensibilizavam o povo para as visitas pastorais e como o povo nos acolhiam”.

“É muito positivo aquilo que sinto” — assegura D. Antonino Dias na hora da despedida da Dioceses de Braga depois de ser nomeado bispo de Portalegre e Castelo Branco, a partir de 7 de Outubro.

“Eu corri a arquidiocese toda uma vez e já ia perto do fim da segunda ronda de visitas pastorais e causou incómodo esta mudança porque o arciprestado de Braga já tinha tudo programado e delineado a contar comigo” — recorda o novo Bispo de Portalegre e Castelo Branco, nascido em Longos Vales, Monção.

Há uma zona da arquidiocese que está em desertificação e há outra a faixa litoral que cresce (“a que me estava atribuída territorialmente”) — acrescenta o bispo auxiliar de Braga, em entrevista à rádio de Braga Antena Minho, que é emitida hoje, às 10 horas, no programa “Sinais — a religião é notícia”.

Fazendo um retrato religioso da diocese de Braga, o prelado refere que “somos uma zona de muito culto e às vezes pouca cultura na Fé; o culto também é uma expressão da Fé mas penso que a grande aposta é a cultura da Fé, como defende o senhor Arcebispo e está a ser feito”.

“Uma Fé um pouco tradicional, que às vezes parece que não é uma opção radical da pessoa mas por que vem pda tradição” — é assim que D. Antonino define grande parte do comportamento religioso mas admite que as coisas estão a mudar.
Uma das marcas do seu episcopado foi uma ligação estreita com os padres, sendo um bispo muito próximo dos seus padres.

Daí que ele conheça bem as maiores inquietações dos sacerdotes: “aquilo que mais admirei foi a unidade e comunhão do clero mas aquilo que mais me preocupa é quando algum padre se afasta de viver com os outros padres, deixa de participar nas actividades com outros , deixar de fazer formação permanente, se coloca um pouco à margem. Isso não é um bom sinal e muitas vezes é um sinal de que outras coisas estão acontecer na vida do padre. Queremos muitas vezes ir ao seu encontro mas há sempre uma resistência quando se chega a determinado de viver e de estar que é difícil de contrariar. Mais tarde vão se arrepender mas...”

Para D. Antonino Dias, a solidão dos padres não é o problema porque um”padre não tem o direito de dizer que vive na solidão. O padre só está só se quiser e só sente a solidão se quiser. Esse é o perigo, o padre isolar-se dos outros e de Deus. Quem crê nunca vive só e se isso é verdade para qualquer pessoa, muito mais para um sacerdote.”

Nas suas visitas, D. Antonino Dias reconheceu situações de grande fragilidade de alguns padres pois “admirava como é que alguns senhores padres, com paróquias pequeníssimas, com pouca gente, ali passaram uma vida inteira, com uma austeridade que me surpreendia. São heróis e exercem um autêntico sacerdócio na multiplicidade dos sentidos”.

D. Antonino Dias recebe a nomeação para o alto Alentejo como surpresa pela altura em que foi nomeado, quando novo ano pastoral está em marcha e quanto ao local, porque esperava que fosse escolhida outra pessoa que conhecesse melhor Portalegre e Castelo Branco.

Na romaria de Porto d’Ave, D. Antonino Dias lançou a “ameaça da explosão de uma bomba social no distrito de Braga”: “preocupa-nos muito a situação económica das família, porque ela é geradora de instabilidade e aqui e no Alto Minho todos os dias vimos fábricas a fechar. Há pessoas que não gostem que se fale nisto mas há certas realidades que a dimensão profética da Igreja não pode ser ignorada. O que eu disse em Porto d’Ave, nem são dados meus, são da União de Sindicatos de Braga — que tem feito um grande trabalho nesse sentido — foi confirmado pelas Instituições de Solidariedade Social. Estamos prestes a que, em Braga, estoure esta bomba social. É uma situação difícil e não se prevê que esteja a desanuviar. Dá impressão que vão vir tempos mais escuros mas tem de haver esperança. Temos de reagir e agir contra a situação, para acém de agradecer àqueles que são capazes de investir para criar novos empregos e procurar a solidariedade de uns com os outros,
nas paróquias temos de ser cristãos e ajudar quem precisa”.

Aos “meus parceiros, os padres”, D. Antonino deixa uma palavra de gratidão — “por tudo quanto fizeram e pela sua gentileza e delicadeza que tiveram sempre comigo, e que não desanimem” — e um convite: “Portalegre e Castelo Branco não são sítios turísticos mas passem por lá para recordarmos os momentos bons que aqui vivemos”.

Tordo: um cicerone de Braga



Às vezes damos connosco a perguntar qual será a razão que explica tão pouca auto-estima dos bracarenses que valorizam tão pouco aquilo que tem dentro da sua cidade e no seu concelho.

Comparativamente com outras cidades de Portugal, os bracarenses não manifestam o orgulho e vaidade que Braga e as suas instituições deviam merecer, a começar pela brilhante noite de futebol europeu proporcionada ontem pela equipa de futebol do Sporting de Braga.

Entre as cinco equipas portuguesas participantes na Taça UEFA, a equipa arsenalista foi a que mostrou melhor perfomance numa competição de elevado nível de exigência.

E, no entanto, quantos espectadores estavam no Estádio Municipal de Braga para ver a sua equipa a defrontar um clube que há dois anos venceu o F. C Porto no Estádio das Antas para a Liga dos Campeões?

Numa noite em que o jogo nem tinha transmissão televisiva, tem de admitir-se que menos de dez mil espectadores, num concelho com 170 mil habitantes, constitui uma marca que não deixa ninguém satisfeito.

A insatisfação deve começar pela direcção do Clube — com cerca de 15 mil associados — que este ano está afazer um grande investimento para que o Sporting minhoto tenha uma equipa de topo nacional e de top europeu.

Uns dirão que a maioria dos bracarenses não se pode dar ao luxo de pagar trinta euros para ver um jogo e que a Direcção desconhece a frágil realidade económica das famílias. Outros dirão que Braga não é só futebol. É verdade mas também aí não falta quem dê o verdadeiro valor àquilo que Braga possui e as suas instituições públicas e privadas desenvolvem.

Por isso, sabe bem ouvir pessoas esclarecidas como o grande compositor e cantor Fernando Tordo que veio a Braga classificou o Teatro Circo como o “mais belo do pais”. Alguns bracarenses com responsabilidades, perante estas realidades, preferem o silêncio, deitar mão dos pormenores para ensombrar o essencial ou — se fosse eu a escreve-lo, diziam que eu era um escriva vendido a dar eco à voz do dono.

Mais, também devia aumentar a auto-estima dos bracarenses ouvir um grande senhor da musica portuguesa destacar o talento de dois grandes músicos bracarenses, como os Josés Sarmento e Talaia. Mais ainda, que este grande senhor da musica lusitana lhes dedique um concerto com orquestra no dia 4 de Outubro, no mais belo teatro do pais.

Mas ainda aproveitamos mais uma achega de Fernando Tordo para ajudar os bracarenses a gostarem mais da sua cidade. Ele disse — e citamos, do alto dos seus 43 anos de carreira — “Braga é uma cidade da linha da frente em termos culturais”.

Gostaram? Eu amei e fico a torcer para que os bracarenses amem mais a sua cidade, o que ela tem, os filhos que gerou e as instituições que lhe dão vida com uma qualidade que devia merecer mais reconhecimento íntimo dos bracarenses.

Em vez de se desgastarem em criticas mesquinhas, invistam o tempo a saborear o que Braga tem para oferecer e é muito. Basta abrir os olhos porque é uma pena que tenham de ser os forasteiros a desempenhar o papel de cicerones daquilo que teimamos em não querer saborear porque não queremos ver.

João dos Anjos: a alma da "Confiança"



João dos Anjos é quase um emblema da Confiança, fábrica de perfumaria e saboaria, mítica fábrica confiança, se calhar uma das mais lucrativas em Braga na primeira metade do século XX e continua a laborar embora “amputada de certos produtos”. A propósito de uma exposição que assinala os 114 anos desta fábrica emblemática de Braga, que decorre na Rua de S. João, por iniciativa da Imago, João dos Anjos partilha connosco algumas das recordações que marcaram os 60 anos que ali viveu.

Num tempo de competitividade feroz, a Confiança de hoje continua a fabricar “bons produtos, como há 50 anos, em que eram apreciados no mercado português e e lá fora” e a vida de João dos Anjos confunde-se com a história da empresa.
João dos Anjos destaca os perfumes TS ou Veleiro, com uma base de alfazema que é muito agradável quer para senhora quer para homem e nos sabonetes o Alfazema”.

Nasceu na rua Nova de Santa Cruz em 1894, e João dos Anjos testemunhou os momentos altos desta empresa que chegou a produzir oito mil caixas de perfume por mês e quatro mil caixas de sabonete por mês, em finais da década de 30. Pastas dentífricas e pó de arroz eram também fabricados nesta empresa cuja marca social é notável com assistência medica aos trabalhadores e seus familiares bem como salário integral mesmo que o trabalhador faltasse por doença.

João dos Anjos começou a sua vida de 60 anos ao serviço da Confiança aos 11 anos, a 7 de Outubro de 1932, quando completou a quarta classe (“era quase um doutro naquele tempo”). “Fui para atender o telefone mas ele nem sempre tocava naquela altura e ia vagueava pela fábrica nos sectores de actividade sabão, sabonete, pó-de-arroz, pasta de dentes e perfumes, e essa atenção resultou. Eu 1944 eu sabia tudo e comecei a estar ligado a todos os produtos que saíam da Confiança”.

“Comecei a fazer de tudo e de nada. Até fazia caixas para sabão. Naquele tempo o sabão não era feito a vapor, mas a fogo directo que punha as gorduras a ferver. Comecei a fazer sabão” — recorda João dos Anjos o homem que estreava todas as máquinas novas que chegavam à Confiança.

“Eu fazia tudo o que havia dentro da Confiança, compor uma água de colônia, fazer a base dos sabonetes, porque era o mais importante porque agora as bases vêm feitas, são importadas” – acrescenta.

Entre as muitas histórias, João dos Anjos como os períodos difíceis da empresa como foi a chegada a Portugal do sabão de Offenback, em cores rosa (de Coimbra para cima) e azul (de Coimbra para baixo) e o nascimento da CUF que fabricava um sabão que “era uma maravilha para as lavadeiras”. Não havia lixívias e o sabão era rei e a “única coisa que tirava nódoas era o sol, era corar”.

“O TS é uma criação minha, um compunha os perfumes que levavam três ou quatro essências, entre elas a rosa da Bulgária que é caríssima. Cheira tão mal tão mal mas dá um aroma e fixação que é difícil de sair.
O contacto permanente com os perfumes era tal que “em minha casa ninguém comia nada daquilo onde eu punha a mão. A minha bata estava sempre suja”. Eu estava em toda a parte da fábrica.

A Confiança tinha três sectores principais: o do sabão, dos sabonetes e dos perfumes. Dentro deste, tinha as pastas de dentes, o creme de barbear (“fui eu que criei o Belopele e depois TS e depois Veleiro”).

A década de trinta foi a altura de maior modernização da Confiança, seguindo-se anos de grande esplendor. “Nós tivemos nessa altura uma creche e um medico para os trabalhadores e suas famílias. O medico dava baixa e a empresa pagava os dias de baixa como se os trabalhadores viessem trabalhar”.

Entre os visitantes ilustres, João dos Anjos lembra-se de várias visitas do presidente da Câmara e até do Marcelo Caetano.
“Eu estava em toda a parte a acompanhar a visita do presidente do Conselho, recorda João dos Anjos. Explicando ao governante como funcionava e o que produziam as máquinas, ao ponto de Marcelo ter desabafado para os donos da fábrica: “este rapaz está em toda a parte”.

Aposentado há 17 anos “sofre com a possibilidade do desaparecimento da Fábrica Confiança. Eu saí em 1992, com 60 anos de trabalho” e recorda ainda o último trabalho que fez: “inaugurar a linha mais moderna de tiragem de sabonetes, que tinha ido comprar a Espanha, que ainda hoje funciona com qualidade e é do melhor que há na Península Ibérica.”

A nossa conversa na rádio de Braga Antena Minho (106 Mhz) não termina sem homenagem aos seus companheiros de trabalho.
“Sempre foram gente muito honesta, gente muito séria e grandes trabalhadores" — conclui.