Já aqui escrevemos que a vida de Fernando Pessoa foi
uma constante divulgação da língua portuguesa: nas próprias palavras do
heterónimo Bernardo Soares, "a minha pátria (sic) é a língua
portuguesa".
Em qualquer génio, há sempre um elemento de diferença,
um grau de superioridade que não se explica, apenas se constata, mas a sua
genialidade não nasce do nada.
O génio em formação beneficia de certas condições
familiares ou ambientais ou é estimulado por acasos da vida que podem ser uma
coisa simples, vista ou ouvida e logo esquecida que, numa criança, pode mudar
todo o curso futuro da sua inteligência.
Em Fernando Pessoa não é difícil perceber porque
floresceu tão cedo nem porque se manifestou no domínio das letras.
Ele é o primeiro filho de um casal muito culto e
informado sobre a actividade “menos útil mas mais sublime da inteligência
humana: a criação artística”.
O pai era um apaixonado grande pela música e
Richard Wagner era um dos
compositors preferidos, sobre quem escrevia crónicas nos jornais. Sabemos que
Pessoa mesmo quando se esquivava, nos últimos anos, dos factos mundanos,
continuava a gostar de ir a concertos de música clássica.
A Mãe, Madalena, era amante dos livros que lia em
português e em francês e também fazia versos.
Havia também uma tia da mãe que fazia versos e que ele
definiu como “mulher culta”, céptica em religião, aristocrática e monárquica e
não admitindo no povo o cepticismo”.
Estes factos explicam que foi fácil a Fernando Pessoa
aprender a ler e a escrever aos quatro anos de idade. A mãe ensinava-lhe também
o francês pelo que o nosso escritor foi uma criança privilegiada.
A infância de Fernando Pessoa foi marcada or
acontecimento inesquecíveis para o pequeno Fernando. O pai morre em 1893,
quando ele tem cinco anos. A sua casa cheia de gente, de repente fica quase
vazia, com uma avó Dionísia demente, e a família empobrece materialmente sendo
obrigada a abandonar o casarão do Largo de S. Carlos.
Muda-se, com a família, para nova casa mais pequena e
um ano depois perde um irmão que reagiu mal a uma vacina contra a tuberculose.
Toda a vida do poeta foi perseguida pelo medo de
herdar uma das duas doenças que tanto ensombram a sua infância: a loucura da
avó Dionísia e a tuberculose do pai.
Nunca manifestou sintomas do primeiro dos males e as
afirmações de loucura em Álvaro de Campos eram aitudes literárias sem peso
maior, e a alegada intenção de se internar num manicómio, numa carta à namorada
Ofélia, foi um pretexto artifical para não se comprometer com ela.
No entanto, o receio da loucura é real na vida de
Fernando Pessoa, sobretudo após o seu regresso a Lisboa, em 1905.
Com maior razção, receava ser vítima da tuverculose,
dada a fragilidade do seu corpo, adoecimentos com frequência e embora não fosse
hereditária, a tuberculose parecia ser uma ameaça na sua família. Vitimara o
pai, o irmão e o tio.
Entretanto, a mãe de Pessoa conhece um oficial da
Marinha, iniciando uma relação a que os familiares franziram o olho, um vez que
Madalena tinha enterrado o marido há menos de um ano.
A vida em comum obrigava o casal a mudar-se para
África. Que fazer com o filho Fernando? Temiam-se as febres tropicais. Ficava
em Lisboa com a tia Maria ou era mandado para a Tia Anica, nos Açores?
A este dilema, Fernando Pessoa responde com um poema à
mãe:
“Eis-me aqui em Portugal
Nas terras onde eu nasci.
Por muito que goste
delas,
Ainda gosto mais de ti”.
É talvez o primeiro poema de Fernando Pessoa, escrito
em 26 de Julho de 1896.
A mãe acabou por levar Fernando para Durban, na África
do Sul, em Janeiro de 1896. O poeta tem oito anos de idade. São estes sete anos
e pouco de vida que impedem Fernando Pessoa de ser um poeta inglês, devido à
sua grande ligação afectiva a Portugal.
Ao longo da vida, Fernando Pessoa, dentro ou fora de
Portugal, manteve sempre uma firme lealdade ao país onde nasceu e as muitas
saudades exprimidas na sua poesia evocam a infância, não na África do Sul, mas
em Lisboa, que para ele "era o lar, o regaço, o âmago da sua pátria amada”.
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