Tuesday, July 30, 2013

Os rostos da República: Fernando Pessoa (13)


Pode ter perpassado a ideia, nas últimas crónicas, que Fernando Pessoa passou pela miséria, mas a verdade é que nunca esteve à beira dela, apesar de todos os percalços.

No entanto, é verdade que Fernando Pessoa foi afligido, durante toda a sua vida adulta, a começar na adolescência, por crises de depressão, devidas ao seu exacerbado sentimento de solidão.
Já em criança sentia necessidade de se isolar dos outros e mais tarde reconhece que apenas Mário de Sá-Carneiro era “o maior e mais íntimo amigo”.

Em que consistia essa intimidade, na troca de poemas para serem comentados reciprocamente.
Estranhamente nunca se tratam por tu, mas falam das suas angústias, receios e depressões, mas quase sempre num tom literário, elevado, com recurso a metáforas, imagens requintadas e recurso a passagens das suas obras.

Sá-Carneiro queixava-se mais vezes da falta de dinheiro e pedia a Pessoa para ir pedir ou cobrar dívidas a amigos em Lisboa.
Quando Sá- Carneiro caminhava para o suicídio, Fernando pessoa escreve-lhe que “há barcos para muitos portos, mas nenhum para a vida não doer, nem há desembarque onde se esqueça. Tudo isto aconteceu há muito tempo mas a minha mágoa é muito antiga”.

Sá-Carneiro era o mais inseguro dos dois, com receio de ofender ou incomodar o outro mas sempre aflito quando as cartas de Pessoa tardavam a chegar. Pessoa tinha uma irresistível capacidade para se distanciar das suas emoções, algo impessoais, como se fosse um observador de si próprio… até ao dia em que o seu amigo Mário se entregou numa aventura sem retorno com uma “personagem feminina”.

Pessoa reagiu com ciúmes face à prostituta Helena ou estava a reagir ao afastamento definitivo – o suicídio de Mário, a 26 de Abril de 1916?

Pessoa entendia o sexo como “elementos de obscenidade” que eram um “estorvo a certos processos mentais superiores” mas estava ainda vivo, como demonstra numa carta publicada em 1915, embora com uma orientação pouco clara.

Em Agosto desse ano escreve Antinous, em que o imperador canta a sua dor e o seu amor perante o cadáver do jovem amante, que morrera afogado no Nilo. É o mais belo poema de amor que Fernando escreveu, com muito desejo sublimado, com a expressão repetida “Ai de mim!” perante uma rapariga a quem fez olhinhos mas não teve atrevimento para mais.

O jovem poeta estava confuso e baralhado. Queria relacionar-se com mulheres (entre 1914 e 1920) ou colocar-se em causa sexualmente devido à sua timidez com as mulheres? Em parte, era assim, como demonstra uma carta que escreve a João Gaspar Simões. Nessa carte, Pessoa reconhece ter duas sexualidades à parida, representadas pelos poemas Epithalamium e Antinous.

Em 1916 ainda confessa ser virgem, enquanto Mário de Sá-Carneiro se desenvencilhava desse problema com uma prostituta, em Paris. Na gravura, o seu poema Aquele outro.

Um dia, um dos seus heterónimos, Henry More, avisa-o a 28 de Junho de 1916: “não deves continuar a manter a castidade. És tão misógino que te encontrarás moralmente impotente e, dessa forma, não produzirás nenhuma obra completa na literatura”.

Esta inquietação sexual coincide com o despertar espiritual de Fernando Pessoa, entre 1915 e 1918: “um génio inteiramente só, por mais genial que seja, é tão carente de sentido como um Deus suspenso no vazio”.

Fernando Pessoa necessitava de ligar a sua vida com outros seres humanos, no plano afectivo, ou seres superiores, no plano espiritual. A verdadeira busca começa agora para ao autor de “A Mensagem”.

No comments: