Tuesday, July 30, 2013

Os rostos da República: Fernando Pessoa (11)


O maior artista, escreve Campos (perdão, Pessoa) terá múltiplas personalidades (quinze ou vinte), exactamente como Fernando Pessoa (um poeta fingidor) que tinha dias “monotamente agradáveis” em que se consolava “com o pensamento astrológico de que não podia acontecer nada realmente grave”.

Mesmo que acabasse o dia “sem jantar porque não tinha dinheiro” nada se comparava à “mistura de megalomania e ideias religiosas (que de modo algum atacaram a lucidez)”…porque a astrologia era uma das razões mais úteis para ocupar o seu tempo de leituras. Fernando Pessoa chegou mesmo a fazer o horóscopo de Álvaro de Campos e de Ricardo Reis.

Nesse mesmo ano, Fernando Pessoa escreve uma frase que deixa o mundo português escandalizado: “o desdobramento do eu é um fenómeno em grande número de casos de masturbação” só possível explicar por um adulto que “nunca fui senão uma criança que brincava” – conforme palavras postas na boca de Alberto Caeiro, a 7 de Novembro de 1915. 

Melhor dito, Fernando Pessoa foi um bebé crescido num corpo adulto que jogava xadrez onde as peças eram personagens criadas por si.
Em JUnho de 1914, no momento do parto de Álvaro de Campos e de Ricardo Reis, Fernando Pessoa escreve à mãe, em Pretória, onde afirma: “os meus amigos dizem-me que eu serei um dos maiores poetas contemporâneos”.

Apesar disso, Pessoa sentia-se inquieto, apesar de consciente do seu génio invulgar que ansiava pelo reconhecimento público que receava.
Sentia que o rumo da sua vida estava a mudar, o que era terrivel para quem entendia que “mudar é uma morte parcial; morre qualquer coisa de nós” bem como “mudar é mau, é sempre mudar para pior”.

Pessoa falava muito das saudades de infância e estas aumentaram com a idade, em reacção à morte que lentamente se aproximava dele, dele como de toda a gente.

Pessoa tinha um medo de crescer. Podia viver para a celeridade póstuma mas não se sentia preparado para a vida que o comum dos homens leva “casado, fútil, quotidiano e tributável”.

Não era um homem de família, que justificava com as suas ambições literárias e por ter um lugar seguro na família que o trouxera ao mundo. Contudo, essa família desmoronara-se com o correr dos anos, passando então a viver sozinho, numa série de quartos alugados todos eles entre os bairros da Estfânia e dos Anjos.

Os apuros económicos – sem apoio familiar — não eram novidade mas começaram a ser maiores, manifestando-se especialmente na década de 1910. Para poder dedicar mais tempo à sua escrita, Pessoa recusava trabalhos com horário fixo numa altura em que todos os amigos e familiares lhe tinham emprestado dinheiro, às vezes montantes elevados.

Acrescem a estas dificuldades, a aflição durante toda a sua vida adulta por crises de depressão, derivadas do seu exacerbado sentimento de solidão, neceesidade sentida desde a infância. “Um amigo íntimo é um dos meus ideais, um dos meus sonhos, mas um amigo íntimo é algo que nunca terei” – confessava Fernando Pessoa, em 1917, profetizando está dolorosa estranha forma de vida.

Numa carta escrita à mãe, em 1914, Fernando Pessoa referia-se a Mário de Sá-Carneiro como o “meu maior e mais íntimo amigo” traduzida em mais de 200 cartas e postais desta e quase nenhuma de Fernando Pessoa. Era uma amizade literária  de troca de poemas e de textos ou a pedir a Pessoa que visitassem amigos lisboetas que lhe deviam dinheiro.

Raramente Fernando Pessoa era banal nas poucas cartas que restam para Sá-Carneiro que se revelava o mais inseguro dos dois e neceesitava da aprovação de Pessoa para se libertar das suas depressões em que “me dói a vida aos poucos, a goles, por interstícios. Tudo isto está impresso em tipo muito pequeno num livro com a brochura a descozer-se”. 

Antecipava-se um momento dramático para Fernando Pessoa: a morte do seu amigo.









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