
Se fosse vivo, José Afonso tinha celebrado Domingo oitenta anos de vida, mas ele continua vivo, 24 anos anos depois, através das suas canções e das suas letras.
Neste país socialmente aviltado e politicamente traficado, onde os valores sofrem desavergonhado escárnio no dicionário do lucro, José Afonso incomoda a esquerda que hoje está nos vários poderes, onde cultiva a falta de escrúpulos a troco das migalhas da 'democracia burguesa' recusada pelo intérprete de Cantigas de Maio.
Este professor de História que contava muitas histórias é o modelo de uma nova forma de estar na vida, na profissão e na política que marca cada vez menos a vida dos portugueses.
José Afonso continua a desafiar-nos hoje a um pouco mais de beleza e decência nas nossas acções, nos nossos princípios de vida e nos nossos comportamentos.
Esta combinação de decência e de beleza está reservada aos melhores de cada geração, que são sempre poucos, mas cada um de nós não pode excluir-se dela.
Jose Afonso é a garantia de que vale a pena ser mais bonito e mais decente pois nos deixou o testemunho feito vida, na poesia, na escola e no combate da cidadania, desse acorde perfeito, que podemos ouvir de manhã ao pequeno almoço, à tarde, na praia ou entre a folhagem das árvores.
O cantor e compositor de "Grândola, Vila Morena" era Terno e agressivo, sarcástico e sensual, cantor de raízes populares mas erudito, credor de um trabalho personalizado mas aberto à criação colectiva, sentimental irónico, andarilho dos grandes espaços, implacável quando afrontava a hipocrisia, humilde, contraditório e teimoso mas nunca sectário, atrevido frente à doença.
Quando desapareceu de entre os vivos, José Afonso explicou-nos calaremente que é possível viver como os melhores sabem viver: solitário e solidário, intransigente e dialéctico, leal nos ódios e nas paixões.
Agora, 24 anos volvidos sobre a morte do cantor, José Afonso desafia cada um de nós a viver no trabalho, na vida, no lazer e na política "todo o alfabeto dessa alegria" com decência e beleza.
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