Thursday, March 18, 2010

Cem anos de República no Minho (2)



Explicamos na crónica anterior que a implantação do regime republicano, há cem anos, começou com as invasões francesas que fizeram sangrar o Minho há 200 anos e semearam o terror, destruição e custaram milhares de vidas no Minho. Apontamos algumas razões que explicam a lentidão da implantação dos ideais franceses em Portugal, cuja primeira tentativa aconteceu em 1820.

Assim, estavam criados os ingredientes para novo conflito entre os portugueses, em 24 de Agosto de 1820, como eco da revolução liberal espanhola, aproveitando uma ida de Beresford ao Brasil para trazer de lá dinheiro para pagar as despesas militares. O país parecia não ter emenda, depois do desastre dez anos antes... como veremos na próxima crónica que não passará ao lado de Braga e dos arredores.

Pode dizer-se, à distância, que foi uma revoluçãozinha com estragos irreparáveis que não agradou nem a gregos nem a troianos, mantendo-se as mesmas ordens, os mesmos lugares, os mesmos ofícios, a magistratura e o livre exercício da autoridade que se acha depositado nas suas mãos.

Acrescentou-se apenas a possibilidade de "ninguém ser incomodado pelas suas opiniões ou conduta passada e as medidas para evitar tumultos e a satisfação de ódios ou vinganças particulares" - como decretava a Junta provincial do reino, naquele dia 24 de Agosto de 1820.

Esta revoluçãozinha não respondeu a três questões nacionais: "que ideias baseavam o pensamento dos homens que lideraram esta revolução? Como se integra na conjuntura nacional e internacional do momento? e Que transformações, a curto, a médio e longo prazo vai impor ao país?"

Sem respostas a estas perguntas, a 15 de Setembro, os liberais de Lisboa revoltam-se e expulsam os regentes com o objectivo de organizar eleições para as Cortes que são mandatadas a elaborar a nova Constituição do reino. Os Liberais exigem o regresso do rei D. João VI com a condição de prestar juramento à nova Constituição e o fim imediato do domínio inglês.

Os liberais assumiam-se como um movimento vincadamente nacionalista mas o rei D. João VI, não tinha qualquer noção da portugalidade, porque tinha ido em criança para o Brasil e dava-se bem por lá. Ele assumira o trono em 1816, com a morte de D. Maria I, mas deixara-se ficar no Brasil, apesar das tropas francesas há muito terem deixado Portugal.

Conciliar o antigo com o novo — a velha monarquia com ideais constitucionais — foi o desafio nunca conseguido pelos liberais, porque também não conseguiram a adesão do povo à revolução. Este gostava muito mais do popular D. Miguel e a revolução deu um fruto: a criação do Sinédrio, um conjunto de magistrados, negociantes, proprietários e militares.

São eles quem fazem uma constituição que D. João VI aprova em 1822 mesmo reduzindo-lhe os poderes separados agora em Judicial, legislativo e executivo. A Europa olhava para a revolução de 1820 como "democrática e perigosamente progressista" e Joel Serrão descreve de forma brilhante como "os países da Santa Aliança tentaram travar a revolução, recorrendo ao bloqueio comercial, à recusa d e passaportes para portugueses e à intervenção militar apoiando os contra-revolucionários".

Apesar das tentativas de conciliação do rei D. João VI, a independência do Brasil é uma consequência da revolução liberal, em 1822, bem como do aumento da população brancas, a vida cultural própria, o desenvolvimento económico com a abertura dos portos ao comércio mundial e a instituição de uma forte administração pública durante os treze anos em que a monarquia portuguesa se refugiou no Brasil, criando tribunais, sistemas fiscais e diversas repartições de serviços públicos, para além de um Governo central que unificou o território.

A influência dos ingleses traduziu-se no incentivo por todos os meios ao rompimento da colónia com o regime "liberal" de Portugal e tudo se consumou a 7 de Setembro de 1822, nas margens do Ipiranga, em S. Paulo, quando D. Pedro se decide: "É tempo! Independência ou morte. estamos separados de Portugal".

D. Pedro assinava um acto profundamente revolucionário e destruía os alicerces da economia portuguesa mas este acto "é um fracasso dos principais objectivos da revolução Liberal. A partir daqui, o novo regime parece condenado. A facilidade com que se eclipsa atesta a estreiteza da base social do liberalismo" (cf. Manuel Villaverde Cabral, in "O desenvolvimento do Capitalismo em Portugal no século XIX", Ed.. A regra do jogo, Lisboa, 1977, p. 74).

O primeiro alerta era dado em 1823, por D. Miguel, o príncipe da Vilafrancada, a quem a "força dos males nacionais, já sem limites, não deixam escolha" acusando os liberais de darem a ruína ao povo e transformarem o rei num "fantasma" de um país onde a "magistratura é diariamente ultrajada e a religião e seus ministros objecto de mofa e de escárnio".

Depois vem nova reacção miguelista com a "abrilada" em 1824 e no ano seguinte Portugal reconhece a Independência do Brasil, um ano antes da morte de D. João VI, aproveitada por miguelistas que obrigam os liberais a fugir para França e Inglaterra.

D. Maria II tem sete anos de idade e D. Pedro IV, do Brasil, entrega o poder a D. Miguel que é aclamado rei em 1828, cargo que exerce até 1832, ano em que é destituído por D. Pedro, até D. Maria II atingir a maior idade. Foram anos difíceis para Portugal, com guerra civil e violenta repressão ideológica dos liberais sempre que "tentavam erguer a cabeça".

Novo revés para os ideais republicanos surge com a guerra civil entre liberais e absolutistas, entre 1832 e 1834, o que ajuda a explicar que a agonia e morte do absolutismo entre nós se apresentasse excessivamente longa.

A relativa precariedade da classe burguesa (porque dependente das benesses reais no Brasil) e a situação social do país, condenavam os militares (comandados por um britânico) a serem o fiel da balança nas situações revolucionárias e contra-revolucionárias que se anteviam entre liberais (D. Pedro) e absolutistas (D. Miguel), adiando a implantação dos ideais da República.

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