Saturday, May 2, 2009

Braga: aproveitou-se um dos que elegemos




Na véspera de mais um Dia do Trabalhador, num país com menos trabalho, os partidos políticos portugueses acabam de dar mais uma prova de total falta de decoro e desrespeito perante a situação de aperto em que vive a maioria dos portugueses. É uma lei rápida, unânime e votada à porta fechada na especialidade e só um deputado sentiu vergonha em participar nesta aventura porque, quando se trata de dinheiro, é tudo igual, da direita à esquerda. A excepção — com um voto contra — é um deputado eleito pelos bracarenses. António José Seguro, ao qual se junto, com uma abstenção, Matilde Sousa Franco.

Que vão dizer da nova lei de financiamento dos partidos os cerca de dois milhões de portugueses que vivem no limiar da pobreza ou como olharão para os partidos políticos os cerca de meio milhão de portugueses desempregados.
Não quero imaginar os seus comentários, porque muitos deles devem ser intranscritíveis.

É que a nova lei do financiamento partidário, agora aprovada na especialidade, alargou para o dobro os valores que os partidos políticos podem receber em iniciativas de angariação de fundos, contrariando o apelo do Presidente da República no dia 25 de Abril para gastos discretos nas campanhas eleitorais que não insultem a inteligência dos portugueses nos tempos de crise financeira e económica que se abateu sobre a imensa maioria.

Esperavam os portugueses que os partidos ouvissem o apelo do mais alto magistrado da Nação, mas como somos um bando de tontos por ainda acreditar que isso é possível quando os partidos discutem o dinheiro que entra nos seus cofres, para além daquele que sai do orçamento do estado.

A nova lei não apenas alarga como duplica os valores que os partidos podem receber em angariações de fundos. Feitas as contas, a valores de 2008, o limite legal passou de 639 mil euros por ano para o dobro - 1.280.000 euros. O PCP não ficou contente porque queria 1,8 milhões de euros.

O que é ainda mais estranho é que este tenha sido o valor afastado do que o PCP tinha proposto. mais do dobro, face ao que estava estabelecido na lei de 2003, contra o qual se bateu o Partido Socialista ao considerar que o PCP ultrapassava o razoável. A proposta do PCP não tinha em conta os interesses do país mas a defesa da sua Festa do Avante e das suas quotas em dinheiro.

Outra das alterações aprovada é a possibilidade de considerar receita de campanha "donativos de pessoas singulares apoiantes das candidaturas", o que até agora só era permitido para as eleições presidenciais e de movimentos de cidadãos às autarquias locais.

Esta lei abre a porta a um maior financiamento privado e que reduz a uma montanha de hipocrisia todas as campanhas dos partidos políticos, sem excepção, infelizmente, de combate à corrupção que está umbilicalmente ligada ao financiamento dos partidos.

Se até agora as receitas de quotas ou de angariação de fundos só residualmente poderiam ser recebidas em dinheiro "vivo", esta situação vai mudar: o valor máximo de 22 500 euros permitido pela actual lei dá lugar a um número com foros de escândalo — nada menos que 1,257 milhões de euros.

Quando uma lei destas é votada à porta fechada, estamos esclarecidos sobre a transparência com que os dirigentes dos partidos enchem os discursos. Que sentido fazem todos os discursos contra o enriquecimento ilícito, contra a corrupção e contra o tráfico de influências? Nenhum para ninguém.

É de estranhar tanta rapidez e consenso... e os portugueses sempre se inquietam sobre o que fica das campanhas tradicionais. Pouco mais fica, além da contaminação com plásticos, papel, ruído, emissões, e acima de tudo contaminação de verborreia e bla-bla-blá que pouco esclarece e mais confunde.

Nos tempos que os portugueses vivem, quase todos os outros gastos são supérfluos, despropositados e um esbanjar inútil, estúpido e ofensivo de dinheiro que é preciso na saúde, na protecção do emprego e dos idosos, na educação ou, porque não, na limpeza do lixo das estradas para o qual as campamhas eleitorais muito contribuem.

Estranho unanimismo numa lei, quando alguns partidos gritam contra as maiorias absolutas mas comem e calam quando se trata de receberem mais dinheiro.

Agora, resta esperar que amanhã venham por aí abaixo — como já vieram — estes iluminados do Terreiro do Paço insultar os autóctones porque votam em autarcas de dignidade suspeita e de suspeita transparência. Cá estaremos para lhes abrir o crânio e avivar a memória de virgens prostituídas.

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