Terminávamos a última crónica a falar da heresia do origenismo que terá chegado à Galécia pelas mãos de um peregrino de Braga, Avito, após uma viagem à Terra Santa, como escreve o historiador bracarense Paulo Orósio na sua obra dedicada a Santo Agostinho, Commonitorum, onde fala não só os priscilianistas e dos origenistas, bem como do pelagianismo.
Aliás, estas tendências religiosas da gnose e misticismo vão atravessar os séculos de presença dos árabes na Península Ibérica, como foi o caso do século VIII em que surge uma corrente religiosa anti-trindade, como foi a inspirada por Migécio para quem a Trindade era constituída assim: o Pai, David; o filho, era Jesus Cristo; e o Espírito Santo, era S. Paulo.
Depois surge o adopcionismo, segundo o qual Jesus Cristo era apenas Filho adoptivo de Deus, e filho de Maria.
É neste contexto de fragilidade que chegam os muçulmanos e começa a ficar completo o retrato da região que S. Geraldo vai encontrar quando chega a Braga.
A invasão e conquista muçulmanas da Península Ibérica foram fulminantes. A rapidez das operações (menos de cinco anos) deixou atónitos os hispano-romanos e os visigodos desorientados e quase paralisados. Apenas escaparam ao controlo dos berberes-árabes umas franjas dos Picos da Europa, nas Astúrias (onde se refugiaram os bispos de Braga), e a envolvente dos Pirinéus.
Esta conquista deve-se ao dinamismo religioso da Jihad mas só um apoio muito comprometido de forças no seio da comunidade ibérica romana e visigoda pode ajudar a compreender um colapso tão estrondoso como rápido.
Entre essas causas, os historiadores destacam o “exagerado compromisso entre a Igreja e o poder político que tornou cada um solidário das fraquezas do outro” levando a que eclesiásticos e nobres se colocassem ao lado dos invasosres.
A débil implantação do cristianismo facilitou a adesão dos nativos à nova religião também ela monoteísta e do Livro, acrescendo ainda o descontentamento generalizado do povo vergado pelo peso de impostos. Quem o castigasse menos era bem vindo. Depois, havia uma terceira força acorrentada ao longo de séculos por medidas adversas que ansiava pela libertação. Estamos a falar dos judeus a que se aliaram os escravos e servos, após os nobres debandarem em fuga deixando as cidades sem estruturas organizativas capazes de oferecer resistência aos invasosres.
Pelos anos 741 em diante, os estratos mais baixos da população, explorados pela dominação romana e visigótica, adaptaram-se depressa à nova situação.
Assim se compreende que trinta mil invasores — ou 200 mil, na hipótese mmais exagerada — tivessem tomado de assalto um imenso território com população muito superior.
Os conquistadores não impunham o islamismo aos povos que consideravam detentores da revelação divina (gentes do livro ou Ahl al-Kitáb). Assim, os judeus e cristãos podiam continuar a sua prática e crença religiosas, mediante alguns condições.
A população hispânica divide-se então em três grandes grupos.
De um lado, temos os que aceitam converter-se ao islamismo, proposto antes do ataque, permitindo-lhes ter acesso a altos cargos do poder. O segundo grupo era constituído pelos cristãos que não aceitam o convite da conversão a Maomé. Foram submetidos pela força mas puderam continuar a cuidar das terras como arrendatários, na contingência de serem expulsos.
O terceiro grupo é constituído pelos que negociaram a liberdade, sujeitando-se à dominação islâmica, com certa autonomia religiosa e jurídica. Foi o que aconteceu a Norte, em grande parte.
São os chamados moçárabes, tantas vezes vítimas de humilhação por causa dos pactos celebrados. Os cristãos não podiam andar a cavalo, por exemplo, só podiam andar de burro ou mula, com os dois pés pendentes para o mesmo lado do animal. Não podiam usar espada nem fabricar ou usar armas, para além de terem de acolher nas suas igrejas os viajantes muçulmanos.
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