Foi a sepultar ontem o escritor português cuja vida foi marcada pelo lado feminino, «o dos afectos», alimentados pela sua passagem pelo Minho na sua juventude.
Em pequeno, as tias, as velhas criadas, mimaram o menino e definiram a sua forma de encarar o mundo. Essa herança, em paralelo com a distância autoritária do pai, foi o primeiro passo para preferir a companhia das mulheres.
«Existe uma maior percentagem de mulheres interessadas naquilo por que eu me interesso do que de homens», explicava Alçada Baptista.
Para qexplicar-se melhor, dá-nos um exemplo fabuloso quanto actual. «Num jantar de homenagem, ao meu lado sentou-se uma escritora minha amiga. À frente, um banqueiro. A escritora falou-me do neto, do livro que ia escrever e de assuntos similares. O banqueiro interrompia-nos de vez em quando para contar «anedotas de aviário» sem piada nenhuma. Ali tive consciência nítida da diferença entre o masculino e o feminino».
Em contraponto aos grandes heróis, que detinham muito poder — Napoleão Bonaparte, Alexandre, o Grande, ou Afonso de Albuquerque, Alçada Baptista prefere outros heróis que impuseram a cultura de cortesia como S. Francisco de Assis e Dante, como Jesus Cristo ou Ghandi:, eles aproximaram-se das pessoas e do mundo sem usarem o poder.
Por isso, para Alçada Baptista não era da discussão que nascia a luz. A luz nasce muito mais da cooperação, da comunhão, do afecto e só a mulher tem esta capacidade.
Se no colégio dos Jesuítas, em Santo Tirso, aprendeu «que tinha de salvar o mundo e os pobres, o que de mais importante aconteceu na sua vida foi a entrada da mulher na história, num tempo em que, quando uma mulher passava a conduzir, se dizia: “Olha uma mulher a guiar!”.
No futuro, o escritor considera que os homens se devem feminizar, ou seja, assumir sem vergonha o mundo dos afectos. As pessoas têm muito mais poder, de muitas naturezas, a nível individual, e não através do poder apenas.
Nesse novo poder, destaca-se a importância que as mulheres estão a dar ao diferente e que a natureza do poder se vai modificando à medida que as mulheres tomam consciência da sua natureza e das capacidades que possuem.
Alçada Baptista deixou-nos uma nova maneira de encarar o mundo, o poder, o ser humano, o saber, Deus e os outros, na linha de Emmanuel Mounier ou Teilhard de Chardin. Foi bom tê-lo connosco, mas será melhor se lermos as suas obras, especialmente "Peregrinação Interior".
No comments:
Post a Comment